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O que é (The) National é bom

Os The National são um sério caso de estudo: como é possível uma banda passar por Portugal em dezassete ocasiões diferentes e ser recebida em êxtase típica de estreantes? A banda de Ohio já subiu a praticamente todos os palcos das principais salas do país, já correram Portugal de lés-a-lés por festivais e mesmo assim, a tua relação amorosa com o nosso país não acusa quaisquer sinais de desgaste; pelo contrário, apenas se intensifica.

Dizem as más-línguas que a população portuguesa é a mais ‘triste e solitária’ da Europa, ou pelo menos assim ditam variados estudos. Talvez por isso é que a relação entre os The National e Portugal seja tão forte, ou não tivesse a sonoridade da banda o seu quê de depressivo e melancólico. Não que isso seja necessariamente mau, todavia; cada canção do quinteto tem a capacidade de servir de representação ao estado de espírito, ou pelo menos de um outrora instante da sua vida, dos seus ouvintes. Acima de uma banda sonora, os The National são um ombro amigo. E quem mais precisa de um bom amigo do que essa população “triste e solitária”?

Da parte dos The National, amigos foi aquilo que não faltou; um Campo Pequeno lotado, para se ser mais preciso. I Am Easy to Find, oitavo disco de originais, era a desculpa de mais um encontro com o povo português. Porém, a recetividade do mais recente disco deu-se um pouco ‘assim assim’, anos luz do impacto que High Violet e Trouble Will Find Me tiveram na banda e na sua capacidade de filtrar pelas massas. E essa dificuldade em relacionar-se com este novo trabalho ficou rapidamente assente depois de “You Had Your Soul With You”, “Quiet Light” e “The Pull of You” terem protagonizado o pontapé de saída.

Golos, daqueles capazes de levantar estádios, não se fizeram esperar e apareceram através de “Don’t Swallow The Cap” e “Bloodbuzz Ohio”, com esta última a merecer especial destaque pelo trabalho dos irmãos Dessner nas guitarras e a colectânea de sopros assinada pela banda de apoio dos The National. Mas a estrela desta companhia é, e de forma irrefutável, Matt Berninger, ora gentleman cheio de classe, ora animal de palco solto capaz de dar voz à premissa de os The National serem uma banda de rock.

Este (dócil) monstro não é de cerimónias no que ao sair da sua jaula toca: desde os rugidos de “The System Only Sleeps in Total Darkness” ou “This is The Last Time”, ambas cantadas junto ao público, passando pela correria pela plateia e bancada do Campo Pequeno em “Graceless” e “The Day I Die”, a imprevisibilidade de Matt Berninger é apenas rivalizada com a sua – e dos The National, claro – capacidade de tocarem na alma de todos aqueles que os ouçam.

Por falar em imprevisível, o repertório dos The National contém sempre uma ou outra surpresa no decorrer da atual tournée, e Portugal não foi exceção. Se “Pink Rabbits” foi bem recebida, a verdadeira surpresa da noite aconteceu ao som de “Looking for Astronauts”, lembrança do nosso primeiro grande amor com os The National, o longínquo Alligator, com direito a especial dedicação à astronauta Jessica Meir. Quiçá nessa mesma imprevisibilidade portuguesa, o público faria uma homenagem a Meir, acendendo as lanternas dos seus telemóveis em “Light Years”, balada de I Am Easy to Find e um dos pontos mais altos do disco; “nunca nos fizeram uma coisa destas, vocês são incríveis”, confessaria Berninger.

O desfecho da noite, isto após duas horas de alta voltagem, não fugiu assim tanto da rotina, com um extenso encore, precedido da emblemática “Fake Empire”, a figurar os temas do costume: o combo de “Mr. November” e “Terrible Love”, o bálsamo na alma de “About Today” e a pinga de saudade de “Vanderlyle Crybaby Geeks”, cantada em uníssono somente pelo Campo Pequeno. “Este foi o melhor fecho possível para esta tournée. Muito obrigado a todos!”. A chave de ouro desta noite foi feita na companhia destas palavras, assim como da promessa de um regresso já em Junho próximo. Já se contam os dias.