Concertos Reportagens

Uma alquimia chamada Mondo Generator

Domingo. Calor de verão. Véspera de início de uma rotina que nos corta algumas asas. No entanto, na maioria das vezes, a música vence todas as forças que nos podem tentar prender ao chão. Aconteceu uma vez mais e, a noite do passado domingo, dia 12 de Maio, trouxe aquele que foi um dos melhores concertos que já assisti no Sabotage Rock’n’Roll Club.

Casa cheia para receber os nortenhos Greengo e os americanos Mondo Generator. Cheia e coberta de calor, tanto corporal como auditivo.
Se da última vez que fiz uma review a um concerto no Sabotage falei de genuinidade, aqui falarei de pureza, humildade e generosidade na pessoa do senhor Nick Oliveri.
Antes de chegarmos a ele, não posso descuidar de um duo portuense que tanto me surpreendeu. Falo dos
Greengo e da sua energia explosiva em cima de um palco como se fossem um grupo de pessoas e não apenas duas. Uma autêntica avalanche que nos arrasta e enrola que teve início às 23h e durou uns rápidos e estrondosos 35 minutos. Com Dabstep lançado em Agosto do ano passado, foram 4 os temas que apresentaram dele: “Red Eyes”, “Heavyman”, “Big Bikes” e “Inhale” sendo os outros 3 novos. A verdade é que é a frescura que nos traz este duo, apesar de não ser novidade, não deixa de ser fresca pelo simples facto de cada explosão, cada arranque, cada acorde de baixo e cada densidade vocal nos empurrar para viagens densas, assustas e sinistras por entre florestas escuras e confortáveis das quais não queremos sair. O doom meio sludge meio metal meio coisas boas deixou-nos rendidos e não foi tarefa difícil a conquista por parte destes miúdos nortenhos! Esperamos voltar a vê-los em palcos lisboetas.

Ao sabermos quem é Nick Oliveri e os Mondo Generator e a humildade que tem em querer pisar o palco de um club com a bagagem que já carrega consigo, podemos imaginar que o concerto vai ser dotado de uma entrega algo transcendental. O que nunca imaginamos é que essa entrega é ultrapassada por tudo o que possamos alcançar e o concerto torna-se, em todo o seu esplendor tanto a nível musical como de presença, naquele que foi um dos melhores concertos do ano e um dos melhores concertos de 6 anos de Sabotage!
Naquele Domingo assistiu-se a uma espécie de rock impiedoso, destemido e implacável. Quase que dizia maléfico no bom sentido da palavra. Um malefício que provém de uma intensidade tal que nos cria ataques de ansiedade e nos faz querer arrancar o coração do peito. Fez-se uma travessia pela quente Route 66 e por toda uma explosão, revolta, raiva saudável e muito (mas muito) fervor sagaz!
Os Mondo Generator subiram ao palco 15 minutos antes da meia noite numa noite extremamente quente. Logo nos deixaram gelados num primeiro impacto, sem saber como reagir a tamanha grandeza. Segundos depois, o gelo derreteu e o calor estendeu-se por todos nós que não conseguimos manter o corpo parado. O cheiro a anos 90 traz consigo, de imediato, o cheiro a verão e o cheiro a stoner traz o cheiro a deserto e esta paleta de cores e sentidos e estados, para o verdadeiro amante, torna-se na mais pura contemplação do prazer.
A estridente e corpulenta voz de Nick abraça-nos e abana-nos sendo que a de Ian não se fica atrás. Queen Of The Stone Age e Kyuss, bandas nas quais colocou o seu grandioso e generoso selo fizeram parte do alinhamento da noite fazendo com que a sala, quase esgotada atingisse pontos máximos de loucura. Mas não foi só aqui que isso aconteceu, “The Last Train”, “Invisible Like The Sky”, “Six Shooter”, “Dead Silence” e “I Never Sleep” foram exemplos que fizeram o público levantar os pés do chão e, até, a pedido de Nick e não só, criar um pequeno e cuidado circle pit (o único que vi nesta sala). “F.Y.I.F.” fora dedicada à força policial de todo o mundo e a intenção notou-se na forma como fora tocada. Músicas antigas e novas fizeram parte desta noite que se complementou com um encanto que superou toda e qualquer expectativa existente. Os riffs eram do diabo e a bateria, por vezes thrash acelerava os corações numa tamanha intensidade onde a loucura sã era quase palpável. Uma hora passou entre os dedos e, depois da insistência do público, voltaram para mais uma entrega genuína de quem não tem merdas nem medos e tocaram mais 2 músicas!
No fundo, esta é a diferença entre um concerto numa sala grande e numa sala pequena. Tudo se resume ao envolvimento, ambiente e energia que circula entre o palco e o público à distância de centímetros, entre almas que se tornam iguais quando o único anseio e o intuito é o amor à música. Quem esteve sentiu algo que não mais vai esquecer não só pelo descrito mas pela qualidade de prestação que viu naquele palco e nos entrou pelos ouvidos, olhos e corpo. Viveu-se um domingo onde nos injectaram uma boa dose de adrenalina que ajuda a começar bem a semana, ainda que com poucas horas de sono.
Obrigada ao
SonicBlast por ter o selo tão bem posto nesta noite e ao Sabotage por nos ofertar sempre as melhores experiências do mundo da música neste século onde a dificuldade em o fazer é cada vez maior.