2018 Concertos Festivais Reportagens Vodafone Paredes de Coura

Vodafone Paredes de Coura’18, Dia 18 – Dead Combo, A verdadeira comunhão dos sentidos

O último dia de festival é sempre um dia que traz um pico de ansiedade desconcertante e receio de que o tempo, que passou rápido demais, acelere ainda mais o ritmo. Para além da nostalgia do último dia, é também um dia de balanços e de, essencialmente, aproveitar o máximo possível o que resta pois a insatisfação é uma eterna constante que nos leva a querer sempre mais.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Ambiente

O dia/noite avizinhava-se cheio e começara com a habitual conferência de imprensa com João Carvalho, Inês Capelo (Ritmos, Lda.) e Leonor Dias (Vodafone) onde ficámos a saber que naquela noite, esgotada, esperavam 27 mil pessoas. Que o recinto sofrera algumas alterações e que viria a sofrer mais no futuro. O objectivo é manter a qualidade e a característica confortável e de boas energias que o festival sempre arrastou consigo! O Vodafone Paredes de Coura não é só um festival de música, mas também de amizade, amor, cultura e ecologia onde, de ano para ano, a aposta em todos estes factores se denota mais. Em 2019 o festival decorrerá de dia 14 a 17 de Agosto e já ansiamos por ele.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Conferência de Imprensa

O Jazz na Relva que acompanhava os banhistas nesta tarde seria com Mr. Gallini e Penicos de Prata.

No recinto e, para começar da melhor maneira possível, o palco Vodafone FM recebia os Keep Razors Sharp. Fazia já um bom tempo que não os via em cima de um palco e, na verdade, soube-me a muito pouco! A harmonia entre as guitarras e estas e o baixo mantém-se e o gosto a psych faz com que desejemos entrar num carro e parar num deserto. São quatro almas individuais e indispensáveis no seu conjunto. Neste concerto há um novo elemento, nas teclas, que ajuda ao contentamento da viagem. A dualidade de vozes que existe transforma a ambiência e penetra em simbiose na mente! Há um certo poder que sai pelas colunas e nos impele à perdição. Eles próprios só falam de amor e essa ligação sente-se na música que criam, deixando o bicho inquieto dentro de nós a ansiar pelo novo álbum.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Keep Razors Sharp

Myles Sanko inaugurou o palco principal neste dia e, com ele, uma soul quente e apaixonante. O público já se estendia até à rampa e dançava calmamente de olhos fechados. Myles Sanko tem o poder de abraçar as pessoas e envolvê-las suavemente na sua música. Com ele apreciamos cada inspiração de ar e sorrimos ingenuamente deixando-nos levar pelo ritmo que tanto lhe corre pelas veias.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Myles Sanko

Os nortenhos Dear Telephone estavam prestes a dar-nos uma quebra de ritmo e de tudo. Com um fundo de teclados e uma atmosfera densa e trabalhada, descobrimos a voz profunda de Graciele perdida no meio de um instrumental aborrecido, gasto e sem qualquer tipo de aura à sua volta.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Dear Telephone

De volta aos ritmos quentes e ao palco principal, Curtis Harding preparava-se para nos reavivar a alma. Com vários tipos de cordas, sopro, percussão e uns óculos cheios de brilho, Curtis apresentou músicas do seu álbum novo, tocou clássicos e homenageou Aretha Franklin. Embora seja um grande senhor, merecia um palco mais pequeno, onde o som pudesse entrar em nós com o poder que efectivamente tem. Apesar disso, foi um bom momento de libertação de males e de dança sensual.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Curtis Harding

No palco secundário Silva e a sua pureza aguardava-nos para nos tentar purificar a alma. O seu registo lo-fi com camadas de boa energia traz-nos a harmonia suave de quem levita alegremente por um campo verde. A dança faz-se de jeito sensível e o intimismo apodera-se. Pessoas ecoam em coro letras soltas e a falta de força faz com que não seja possível registrar mais de meia dúzia de músicas.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Silva

Esperava-nos outro momento de quebra e de necessidade de que fosse de dia e estivéssemos sentados na relva do rio. Nesta edição, a música de sonhadores e para sonhar reinou! O problema é que, ao vivo, a maior parte dela tinha falta de poder e conexão. Big Thief era algo que me enchia de curiosidade, mas que rapidamente me deixou sem interesse. Tudo era perfeito, desde a voz bela, às melodias bonitas e tranquilizantes, ao intimismo e ao folk cristalino, apenas se perdia num palco gigante para 3 pessoas. Apenas estava a tocar à hora errada quando o corpo precisava de energia. Há momentos em que não só precisamos de beleza auditiva como, também, notas e atitudes que transmitam poder e garra. Apenas isso querida Adrianne.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Big Thief

Se era atitude e garra que precisava, ia encontrá-la no encerramento do palco secundário. Yasmine Hamdan deu um concerto simplesmente divinal na sua essência intimista, sensual, elegante e cheia harmonia. Guitarra, bateria, teclas/sintetizadores e voz (dois microfones) num ambiente que mistura a música electrónica com o rock numa entrega e intensidades genuínas de quem faz o que mais gosta. Essas coisas sentem-se e a intensidade daquele momento foi demasiado forte. A voz árabe mescla-se com a sensualidade da dança e dos gestos que Yasmine tem e encarna tão bem… é impossível não ficar em transe e não sentir arrepios a cada nota. A inquietude contrabalançou com a satisfação e vários extremos estiveram presentes em grande parte do concerto. A música que faz parte da banda sonora de Only Lovers Left Alive não ficou de fora e todas as expectativas foram superadas. Mais uma surpresa de músicas do mundo nesta 26º edição do festival.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Yasmine Hamdan

O concerto da noite estava à nossa espera sem sabermos… Os Dead Combo deram um dos concertos mais brilhantes do festival inteiro e ainda bem que assim foi!
À volta de Tó e Pedro, uma equipa de luxo: 2 saxofones, contrabaixo e bateria. Nomes tão fortes que só poderia resultar naquela espécie de magia sonora de uma superbanda que nasceu para fazer música. Durante o concerto entrou-nos pelo corpo uma energia e ritmo que tanto tinha de pesado como de belo. Logo no início montamos uma espécie de serpente e, em cima dela, percorremos vários caminhos e encruzilhadas que nos salvaram a vida. Pelo meio da viagem passamos por diversos momentos, frames e filmes, sítios para onde nos empurrava suavemente a música que saia pelas colunas. Diante de mim assisti a uma alma só! Tanto deles como nossa. A entrega deu-se de ambos os lados e a genialidade resultante da construção musical transformou-se num quadro digno da história da representação das nossas vidas. Alexandre Frazão, na bateria, completava 50 anos naquela madrugada e ofereceu-nos um solo de bateria que foi curto mas cheio de tudo o que precisa para ser bom.
Mark Lanegan, que participou em Odeon Hotel, entrou em palco para proporcionar um momento único e memorável. Juntou a sua voz inigualável aos instrumentos e com ela completou mais um instrumento. Durante três músicas, assistimos à combinação perfeita de dois mundos que dificilmente poderiam resultar bem mas que se fundiram rapidamente num só mundo prestigiante de talento. Tivemos clássicos, modernos e misturas e tudo soou com a maior veemência e sagacidade possíveis.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Dead Combom c/ Mark Lanegan

Aquele que tinha tudo para ser o concerto mais forte da noite, tornou-se rapidamente numa das maiores desilusões. Acredito que o problema esteja em mim pois, na verdade, o que eu vi diante de mim foi o concerto com mais euforia por parte da plateia. No entanto, foi também o concerto onde aquela banda inteligente e audaz que me proporcionou tantos momentos bons, se perdeu pelo caminho. Os Arcade Fire perderam-se num caminho fácil e estranho. Uma estranheza que, por vezes, roçava o “azeiteiro” e isso foi uma chapada demasiado forte. Uma produção digna do estatuto que alcançaram, projecções apelativas e coordenadas, um espectáculo especial e espacial que, tal era a produção, os fazia perder-se no caminho. Começo pelo hype que Everything Now gerou. Aquele que é um dos discos mais fracos da banda é, talvez, aquele que mais impacto criou nas pessoas e, nos adolescentes, principalmente. Tudo indicava que isso ia acontecer… o caminho da electrónica, as letras fáceis e em loop constante, a capacidade de entrar rapidamente no ouvido e, a imagem! A imagem do disco e deles em palco, com um roupeiro inteiro direccionado a uma louca homenagem ao EN, com músicos de braços no ar a pedir ondinhas de braços entre o público… com Régine a fazer figuras terríveis numa tentativa de criar uma dança imperceptível e desajeitada. Preciso de dizer mais? Ainda me falta referir os arranjos de mixagens electrónicas nas intros da clássica “Ready to Start” e da mais recente “After Life” que levou com LCD Soundsystem pelo meio; a intro com a “Everything Now”, a “Everything Now” e, novamente, a “Everything Now” a começar o encore; e depois da ansiada “Wake Up” ainda ouvir Win Butler a entoar “Take a Walk On The Wilde Side” para sair de palco com a música original a tocar. Foi a terceira vez que vi Arcade Fire e, posso dizer, que foi a pior vez de sempre! Claro que vai ser sempre aquela banda com músicas que apertam o coração e nos remetem a histórias e momentos de vida demasiado marcantes. Claro que vou sempre cantar de pulmões cheios as “Neighborhood” todas, as “Sprawl”, a “No Cars Go”, “The Suburbs”, “Ready to Start”, “Wake Up”, etc. O importante nas bandas que seguem por caminhos errados é nunca nos esquecermos daquilo que em tempos significaram para nós e dos bons concertos de antigamente. No entanto, o caminho mais fácil não é, de todo, o melhor, embora chegue a mais gente. Que descansem em paz!

Como já esperado, o vídeo de resumo desta edição começa a rodar, os confettis espalham-se pelo ar e dançamos todos “All My Friends” de LCD Soundsystem com um sorriso rasgado de felicidade. A verdade é que este festival é música, amizade, partilha e amor numa comunhão única.

fotos na galeria Vodafone Paredes de Coura 2018 dia 18 Arcade Fire

Resta-me fazer um pequeno balanço do geral desta edição do melhor grande Festival de Portugal que, apesar de ser positivo, não o é na sua plenitude.
A aposta por bandas que nunca vieram a Portugal ou de gosto requintado ou até, moda, manteve-se fiel às edições anteriores, faltando apenas uma boa gestão de palcos e de distribuição de lineup. Houve concertos a horas que não eram apropriadas e em palcos errados que, muitas vezes, nos levavam a uma quebra de ritmo e aborrecimento. Faltaram, igualmente, mais concertos marcantes. Sai com a sensação de que assisti a concertos maravilhosos, mas assisti a muitos mais sem pingo de emoção.

No entanto, Paredes de Coura oferece-me, sempre, aquilo que eu chamo de calmaria profunda e tranquilidade de alma. Alimenta-me o corpo e a alma e aconchega-me o coração.
Até para o ano, querido Vodafone Paredes de Coura!

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Texto – Eliana Berto
Fotografia – Jorge Buco
Evento – Vodafone Paredes de Coura’18