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O inferno artificial dos Drab Majesty

Na noite de quarta feira às 21h estendia-se pela Rua Nova do Carvalho uma imensa fila de gente que dobrava à Rua de São Paulo enquanto aguardava ansiosa por entrar no Music Box. No menu da noite tínhamos o australiano, radicado em Berlin Kris Baha a abrir a noite para Drab Majesty, projecto de Andrew Clinco a que se juntou nos últimos tempos Mona D.

Os Drab Majesty regressam a Portugal para duas datas, 25 de Outubro em Lisboa e no dia seguinte no Porto, para mostrar o mais recente An Object In Motion (2023, Dais Record).

Uma sala praticamente cheia recebeu Kris Baha que durante 45 minutos arremessou a sua sonoridade que combina uma série de coisas que coabitam mais ou menos perto umas das outras (EBM, industrial, post punk, etc…), de uma forma consistente com tudo aquilo que grita na direcção das multidões. Foi duro, mas na verdade até me parece que teria feito sentido Kriss Baha entrar a seguir a Drab Majesty, porque o andamento deste era muito mais o de uma pista de dança do que os Drab Majesty. Foram 45 minutos perfeitos, para quem milita nestes géneros com fervor, porque a própria entrega à actuação não permitia nada mais que a dança e o público não se fez rogado, dançou, aplaudiu, assobiou e mesmo não pedindo mais porque a massa de gente queria mesmo era ouvir Deb Demure e Mona D. percebeu-se que a escolha desta primeira parte foi muito mais que uma escolha certeira.

Tudo a acontecer a horas certas e o duo faz a sua dramática entrada às 22.30. Vieram até nós supostamente para partilhar An Object In Motion (2023, Dais Record), mas foram  “The Demonstration” (2019, Dais Record) e “Modern Mirror” (2017, Dais Record) que tiveram o maior destaque, conforme poderão verificar na playlist que temos ali mais abaixo.

O público não ficou desiludido com o que ouviu, nada mesmo e a banda correspondeu na medida disso mesmo, carregando no ênfase teatral que os caracteriza entraram em palco com Dot In the Sky (The Demonstration,2019) para logo se lançarem avidamente a uma intensa incursão a  Modern Mirror (2017) de onde repescaram 4 faixas, para destaque para Ellipsis, talvez o momento mais alto até ali. Vanity trouxe alguma estranheza, mas o regresso às músicas mais familiares como Kissing the Soul e mais à frente 39 By Design recuperou o ânimo do público.

Ao contrário do que tem vindo a acontecer no pós pandemia, tivemos um concerto de 90 minutos, mas talvez por ser meio da semana ou porque o andamento do concerto, negro e pesado, bem mais lento que a primeira parte tornou-se difícil de acompanhar com o mesmo entusiasmo inicial da noite, e a sensação no fim foi que tinha sido mesmo demasiado.

As músicas de Drab Majesty não nos trazem nada de novo ou inovador, muito pelo contrário, são construções e adaptações de coisas que ouvimos desde os anos 70/80. É-nos familiar de várias formas. O revivalismo também é isto, o voltar onde fomos felizes. Já vimos noutros sítios a estética e a teatralidade que incorporam nos seus trabalhos. Já sentimos noutros momentos as mesmas sensações que nos despertam. Ainda assim vamos lá cair novamente, é uma formula bem conseguida para os apreciadores do gênero, e muitos dos que estiveram no Music Box no dia seguinte estiveram provavelmente, e de forma inglória à espera de Andrew Eldritch.

Provavelmente serei apenas eu que não estou no momento de compreender os Drab Majesty, mas já em 2017 sei que foi com esta mesma sensação que fiquei e que me deixa  a pensar o que é que para mim aqui não bate certo. E isto inquieta-me porque os Drab Majesty totalmente dentro do espectro do que mais tenho ouvido nos últimos anos, daí que me tenha passado pela cabeça voltar a ver para tirar teimas. Ainda não foi desta. Não sei pela escolha do set, se pela sala, ou outra coisa qualquer.

Passadas 24 horas já não tenho a mesma sensação de peso que tive a partir ali dos 60 minutos de concerto, mas manteve-se o zumbido nos ouvidos, por uma sonoridade desiquilibrada em alguns momentos e embrulhada por excessivamente alta em outras.

No meio disto tudo fico feliz de ver uma casa cheia para uma banda que não anda aí nas bocas do mundo. Mas inquieta-me não ver nada de especialmente novo a suscitar todo esse fervor. Os fãs que me desculpem mas o tal tragic wave onde colam os Drab Majesty não me pareceu assim tãaaooo hipnotizante e o fervor de alguns pareceu-me em certos momentos ser algo muito mais para a foto do que a genuína felicidade que esperaria ver emanar numa sala praticamente lotada. Tão teatrais foram, no seu devido papel, os músicos como o foi a maior parte do público, cheios de uma felicidade artificial.