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Luna Fest, os estrondosos três primeiros dias de festival em Coimbra

O Festival Luna Fest arrancou no passado dia 16 de agosto na Praça da Canção em Santa Clara, na cidade de Coimbra. Depois da grande deceção do cancelamento da atuação dos norte-americanos, DEVO, cuja sua confirmação fora motivo de corrida às bilheteiras por muitos fãs cinquentenários, a organização teve de seguir em frente e avançar com a complexa produção que um festival de música implica. Criaram-se expectativas, boas e menos boas, em torno da sua efectiva concretização. E o que é certo é que já vamos no quarto dia dos ambiciosos cinco dias de música e estão a ser estrondosos!

A forma como toda a praça da alimentação foi organizada e distribuída foi bastante equilibrada. Por outro lado, de louvar a diversidade da comida, com pratos nortenhos de qualidade que puderam ser acompanhados com vinho da região, para desenjoar dos copos de cevada que se bebem aos litros durante os concertos.

A zona principal de WC, para além de em quantidade significativa, foi colocada num local estratégico, mais perto do palco, o que não nos obrigou a percorrer o recinto todo de cada vez que a Estrella Damm estimulou os rins.

A malta do rock gosta de cuidar da aparência e por isso não faltaram stands de todo o género de peças de vestuário, as quais, pela sua originalidade, não se encontram com facilidade em todo o lado. Para além das tradicionais t-shirts das bandas do festival, houve um manancial de outras peças de roupa como blusões, camisetas, tops, etc. Também houve barbeiro de serviço, bem como um tatuador.

No Luna Fest, a pureza do rock ’n’ roll sente-se no tipo de bandas que integram o cartaz, ou seja, músicos “sem merdas” que dão tudo em palco e que ficam para ver os concertos dos outros e se apoiam mutuamente. O tipo de público deste festival não está constantemente agarrado ao telemóvel, preocupado com selfies e a publicar vídeos nas stories, e, assim, a impedir que os outros consigam ver os concertos sem écrans à frente! Pureza na manifestação efusiva de ouvir música e dançar sem preconceitos e sem modas. Deixamos-vos um pouco da nossa experiência na Praça da Canção.

Os The DSM IV, banda de synthpop que sucedeu aos aclamados e extintos The Eighties Matchbox B-Line Disaster, tiveram a difícil tarefa de abrir as hostilidades no primeiro dia do Luna Fest. Foram tudo o que se poderia ter pedido de uma banda de abertura num festival eclético como este: teatrais, interessantes e donos de um som proprietário.

  • 20230816 - The DSM IV @ Luna Fest'23
  • 20230816 - The DSM IV @ Luna Fest'23
  • 20230816 - The DSM IV @ Luna Fest'23
  • 20230816 - The DSM IV @ Luna Fest'23

Seguiram-se os The Speedways que, embora coesos, pareceram ser uma banda de calendário, algo desinteressantes e com um som na linha de bandas como Sum 41 ou Green Day, algo desfasados do espírito mais underground do festival.

  • 20230816 - The Speedways @ Luna Fest'23
  • 20230816 - The Speedways @ Luna Fest'23

O festival voltou a dar cartas com a chegada de Robert Görl. Figura incontornável da vanguarda da música eletrónica alemã como elemento dos D. A. F., Görl alternou o seu set de 90 minutos entre temas da sua carreira solo, em que, inclusive, presta homenagem ao seu eterno companheiro dos D. A. F. Gabi Delgado-López, chamando-lhe “irmão de mãe diferente” e, claro, temas dos D. A. F., guardando para o final “Der Mussolini”, tema maior do dueto alemão. A atuação de Robert assentou no minimalismo expressivo, mas, também, na declamação e postura teatral com que brindou as já muitas centenas de festivaleiros atraídos pela força gravítica dos D. A. F.

O muito aguardado John Cale entrou a horas e anunciou a sua chegada com “Jumbo in tha Modernworld”. Ao longo de pouco mais de hora e meia, o velho mestre revisitou temas ora mais lineares, ora mais experimentais, da fase mais proto punk à new wave. Para o final, o já expectável medley de “Gun” e “Pablo Picasso” não desapontou uma plateia que esperava ansiosamente por Cale e que não saiu defraudada, pese o facto de algumas atuações anteriores do artista em Portugal não terem surtido o efeito esperado.

  • 20230816 - John Cale @ Luna Fest'23
  • 20230816 - John Cale @ Luna Fest'23
  • 20230816 - John Cale @ Luna Fest'23
  • 20230816 - John Cale @ Luna Fest'23
  • 20230816 - John Cale @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Black Lips @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Black Lips @ Luna Fest'23

Após a balbúrdia do primeiro dia, não seria de esperar que as coisas ficassem mais amenas e delicadas – afinal, esta é a terra do rock! Se dúvidas houvesse, os espanhóis Finale decidiram dar-lhes a estocada final. Praticantes de um punk rock abrasivo, niilista e fortemente inspirado por Dead Kennedys, deram o litro em palco e fora dele, muito graças a Pepet, talvez o vocalista mais atípico que passou pelo festival graças a um registo vocal inimitável, caótico, versátil e descomprometido. Levam o prémio de melhor banda de abertura dos cinco dias.

  • 20230817 - Buzzcocks @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Buzzcocks @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Buzzcocks @ Luna Fest'23

Já os londrinos Oh! Gunquit apostaram num som que bem se poderia chamar “qualquer-coisa-rockabilly-e-mais-umas-cenas”, tal é a diversidade musical com que se apresentaram em palco. Os também espanhóis La Élite são de outra cepa. O dueto de Lleida entrou num comboio encabeçado por bandas maioritariamente inglesas, caso dos Sleaford Mods, Hadouken! e dos Does It Offend You, Yeah?. Foram claramente um dos conjuntos preferidos pelo público em geral, com uma atuação baseada no contacto com ele.

Estamos surpreendidos com o calibre das bandas apresentadas no Luna Fest – quem é que no seu perfeito juízo sonharia dar o primeiro concerto de sempre da sua banda a abrir para os lendários Black Flag e Meat Puppets? Os Hickoids, claro. Os texanos ofereceram uma performance que oscilou entre o punk, o rock, o hardcore e a música country. O público não percebeu o que estava a acontecer em palco, algo recorrente no historial de quarenta anos da banda, logo, foi apenas mais um dia no escritório.

Os americanos Black Lips foram uma das maiores surpresas do festival, antecipando a banda do dia, os britânicos Buzzcocks. Formada em Manchester, a banda fechou o segundo dia de Luna Fest sem grande contemplação por regras – passados 5 minutos da sua entrada em palco, desfiaram o clássico maior “What Do I Get?” para gáudio dos presentes. Foi um dos melhores concertos dos cinco dias sem pensar muito, com um Steve Giggle a dedicar todos o seu talento aos presentes. Memorável.

Como é habitual, a atuação das primeiras bandas fica sempre um pouco prejudicada, pois raramente consegue uma vasta audiência. Não foi exceção com os The Phobics e os The Star Spangles, que abriram o palco no terceiro dia do Luna Fest. Os primeiros, banda dos punks sobreviventes de Deptford (Londres), mesmo para pouco público e ainda meio tímidos, rasgaram as guitarras e soltaram a voz com sede de palco. Já os The Star Spangles, estreantes em Portugal, não aqueceram muito a malta que se ia juntando no lado da sombra. Um frontman fraco, demasiado eclético e com demasiadas parecenças com demasiados músicos (ouvimos dizer, no público, que parecia um Nick Cave nos seus primórdios).

© Luna Fest

 

© Luna Fest

Os The Fleshtones deram o pontapé de saída para a boa disposição da noite! Peter Zaremba, divertido e sempre a interagir com o público num castelhano meio rebuscado (talento), regressou aos palcos da cidade de Coimbra com a mesma energia de há mais de 30 anos atrás.

© Luna Fest

Victor Torpedo, músico de várias bandas e um dos “lunáticos” do festival, subiu ao palco em dose dupla. Primeiro, com Victor Torpedo and The Pop Kids e, depois, com os brutais The Parkinsons. Mas há lá coisa mais estilosa do que, como num passe de magia, ajeitar o cabelo, tirar a camisa e continuar a tocar a guitarra como se não houvesse amanhã? Grande Torpedo, que, juntamente com a responsabilidade da organização, ainda consegue estar duas horas em palco com duas bandas (apesar de tudo diferentes) a transbordar a sua paixão pelo rock e transmitindo uma energia contagiante ao público que acompanhava também a inquietação revigorante do Afonso (The Parkinsons). E não seria um concerto completo dos The Parkinsons sem a ternurenta presença de Kazuza, uma figura omnipresente nos seus concertos!

© Luna Fest

Para acalmar as hostes, e já depois das 00h00, vieram os sempre festivos La Femme. Mais de meia dúzia de músicos em palco com adereços diferentes, desta vez, de preto e branco, e com os elementos femininos com longas cabeleiras. Uma pop eletrónica à qual ninguém conseguiu ficar indiferente, com direito a encore.

© Luna Fest

 

© Luna Fest

Com um som impecável ao longo de todos estes dias, o Luna Fest conseguiu o improvável e voltou a trazer a linha da frente da música a uma cidade acostumada à ausência de iniciativas culturais de maior expressão. Mesmo em período de férias académicas, a organização do Luna Fest já arrecadou 20 valores!

Outras galerias fotográficas dos 3 primeiros dias de Luna Fest:

DIA 16 AGOSTO

The Understones

  • 20230816 - The Understones @ Luna Fest'23
  • 20230816 - The Understones @ Luna Fest'23

DIA 17 AGOSTO

Ambiente

  • 20230817 - Ambiente @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Ambiente @ Luna Fest'23

Finale

  • 20230817 - Finale @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Finale @ Luna Fest'23

Oh! Gunquit

  • 20230817 - Oh! Gunquit @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Oh! Gunquit @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Oh! Gunquit @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Oh! Gunquit @ Luna Fest'23
  • 20230817 - Oh! Gunquit @ Luna Fest'23

Fotografia – João Correia