Opinião Reviews

Um Corpo Estranho apresenta “Homem-Delírio” no Sabotage Club

João Mota e Pedro Franco são uma diversidade de talento artístico. Um constante namoro com as artes plásticas e performativas, integraram os Novos Talentos FNAC em 2013 e foram aplaudidos pela crítica sendo uma das apostas da Revista Blitz em 2014, graças ao seu EP homónimo editado em 2012.

 A dupla setubalense Um Corpo Estranho, que tem caminhado nas artes de peito aberto e cabeça fora da caixa, apresentaram o seu terceiro trabalho de originais, Homem-Delírio, no passado dia 11 de Maio no Teatro São João em Palmela.

Homem-Delírio é um conjunto de sonoridades personalizadas num mesmo tempo e numa mesma narrativa. As vozes entram em nós como cristais reluzentes em coros delicados e que muitas vezes bafejam uma dor boa. Numa afinação quase angelical, “Fio a par do Mal” é o tema que abre uma viagem sonora na liberdade de composição e na diversidade melódica. Uma guitarra solta que se entrecruza numa “liberdade de Sangue Irmão (…) travando as guerras dos outros.” Um registo meio carioca nas cordas lusitanas, um violão sustentando uma voz que emaranha sem medo e por ele se deixa enfeitiçar. “Homem-Delírio”, nos murmúrios que saem na delicadeza da voz e que se sustenta na simplicidade dos acordes da guitarra, “(…) sofro a derrota de ombros caídos.” Encontramos “Estrangeiro” a meio da viagem, no jogo de cordas repetidas e nos coros fluidos que terminam nos arranjos de percussão numa “gente sofrida sem lei”. O tema que surge a seguir, “Escombros”, é uma autêntica banda sonora de um Western americano. Nos acordes eternizados por Neil Young, visualizamos chapéus de couro enlameados de sangue. Na sombra das copas das árvores, avistamos dois rostos cansados reflectidos nas águas paradas do Mississípi. Quando chegamos ao fim da música, voltamos a ouvi-la “Escombros” de olhos fechados.

No domínio do piano surge uma voz que pergunta e responde, “é preciso perder, abrir mão, libertar”. Coros orquestrais envoltos no sofrimento de uma “Hera”, que cresce nos acordes das teclas como se de uma orquestra se tratasse. Já a caminho do fim, “Só o Paraíso”, tema que se desenvolve na coerência da guitarra e do piano, mas que surpreende em intervalos de distorção lá ao longe. A presença do acordeão e a voz saída de um transístor definem a identidade da “Valsa do acaso” que se despede do “Homem-Delírio”. Acordes curtos da guitarra clássica, que vão sendo suprimidos em cortes momentâneos e que rompem com ligeireza os sons mais agudos da guitarra eléctrica.

O Homem-Delírio será apresentado em Lisboa no Sabotage Club no Cais Sodré na próxima 6ª feira 13 de Setembro, e a Música em DX vai lá estar para fechar os olhos e embarcar nesta viagem.

Fotografia (capa) – Rui David