Concertos Reportagens

Rodrigo Amarante, “A projecção da chegada ajuda o caminho.”

Na 3ª feira passada, por volta das 22h00 subiu ao palco do Tivoli BBVA, o canta-autor carioca Rodrigo Amarante. Ex- Los Hermanos, Rodrigo Amarante é um músico sui-generis no registo sonoro e poético. Sons minimalistas, ritmados com a insistência da clareza dos acordes. Ou seja, Rodrigo Amarante simplifica a vida de todos! Jogo permanente na fonética das palavras, muito mais no que nos sentidos antagónicos que as mesmas provocam nas rimas.

Solitário no meio dos seus instrumentos, simples e simplificados na aparência e na sonoridade, uma guitarra acústica e um pequeno piano. Palco grande, imenso para a proximidade desejada entre ele e o público. Sala muito composta, com os fãs num constante de “discos pedidos”. Relação de cumplicidade, visível na manifestação do silêncio agradável que o público proporcionou durante as músicas e os momentos de confidências (que foram muitos) de Rodrigo!

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“O Cavalo” último CD (lançamento na Europa em Maio de 2014) foi percorrido na integra, com algumas novidades pelo meio (alguns da Orquestra Imperial). Temas não gravados (“Noster”) e temas ainda por gravar (“Ma and Pa”). Subida ao palco com um sorriso sincero de quem está a pensar “Deixa ver como corre”, e correu tão bem! “Nada em vão” dá o mote da noite e do início do álbum. Conta a história triste de “I’m ready”, terceiro tema da noite. O pensamento de uma mãe quando recebe uma medalha de mérito do filho, que morre na guerra. As canções de Rodrigo Amarante são assim, estórias de gostos e desgostos, dos dele, dos outros e das nossas. “Mon Nom”, a subtileza da xenofobia por que todo o estrangeiro passa (poderia ser auto-biográfico).

Intercalando os idiomas, inglês, português (brasileiro), francês e espanhol (“Tuyo”), Rodrigo não cansa. Num dos desabafos, partilha a angústia que é saber que está a cantar para uma audiência portuguesa. Toma consciência do peso das palavras, por estar a soletrá-las num “português correcto de Portugal”! Intercala também a diversidade do registo, entre o gingar carioca do violão e a nostalgia das teclas do piano.

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Quando diz que não sabe o que irá tocar mais, alguém do público grita “Tuyo” e ele segue o concerto com “Tardei”. Enquadra o sentido da letra, a “projecção da chegada ajuda o caminho”, como se projectar a chegada possa aligeirar a turbulência do caminho. “Tuyo” o tema pedido, toca-o quase no final no meio de fumo e cheiro intenso a baunilha (no meio das brumas de avalon diz a sorrir!).

A inevitabilidade da vida como… envelhecer. Quando olhamos para os nossos pais e tomamos consciência do efémero (“Ma and Pa”), O fantasma do avô português que o persegue, e o manda “para trás das montanhas” (Amarante?). Rodrigo dedica temas à sua família, aos professores e aos amigos (tema “Hourglass” a Kalaf Epalanga). Um poema dedicado a Lisboa escrito nos camarins do Tivoli naquela mesma tarde, onde as palavras “gin”, “sorriso”, “alto” e “louro” combinavam entre elas! Soltámos muitas gargalhadas, com o seu humor inteligentemente descontraído e sincero (“eu sou um amador…”).

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Um encore inevitável com dois temas, seguido do agradecimento de Tom Jobim, “Saravá”. Uma bela noite de prosas e versos, de gargalhadas e asneiradas. A projecção da chegada de Rodrigo Amarante ajuda-nos a prosseguir o nosso caminho mais determinados.

Texto – Carla Sancho
Fotografia – Ana Pereira
Promotor – Sons em Trânsito