A cidade de Lisboa tem sofrido alterações nas dinâmicas sociais nos últimos anos, e notoriamente nos últimos 5 anos. As razões têm origem em várias dimensões, mas uma que tem um peso significativo é a especulação imobiliária. Contudo, esta é uma dimensão que tem um impacto transversal nas várias vertentes da sociedade, e inevitavelmente na malha cultural da cidade. Espaços que se concentravam no centro da cidade encerraram, dando lugar a outros com diferentes características e diferentes públicos. Os espaços do Rock’n’Roll têm sido, definitivamente, muito fustigados nesta roda livre do mercado imobiliário. Mas apesar dos desafios que se apresentam cada vez maiores, a malta que vive do e para o Rock, vai criando relações simbióticas em novos espaços, e rejuvenescendo dinâmicas comunitárias que estão em risco de desaparecerem.
A editora independente Anti-Corpos Records, assumiu o desafio de ser parceiro da ADF – Academia Dramática Familiar 1º de Novembro, e assegurar uma programação musical deste espaço incrível, localizado em Lisboa na Rua da Praia de Pedrouços. Apesar desta programação não ter tido início agora, somente no passado sábado tivemos a oportunidade de usufruir deste ambiente acolhedor e conhecer esta pérola lisboeta.
E foi numa espécie de celebração da vivacidade do R’n’R, que os Dapunksportif consagraram os seus quase 21 anos de existência e apresentaram o sexto álbum de originais, ‘Rock and Roll Salvation’, editado pela Anti-Corpos Records. Gravado em outubro de 2024 nos estúdios Namouche em Lisboa, contou com a produção do conceituado músico e produtor Alain Johannes.
Não podemos deixar de assinalar o facto de, passado duas décadas, os Dapunksportif se manterem fieis a um Rock visceral e, teimosamente arriscarem a pureza dos riffs das guitarras, dos movimentos roqueiros de pernas e de uma certa liberdade de improviso que se manifesta no prolongamento dos temas ao vivo.
Paulo Franco, que dá a voz, a guitarra (de apoio) e a sua presença, numa entrega total na persona de palco, conduziu o concerto num despique provocador com os restantes músicos. A cumplicidade entre os músicos e estes e o público, sentiu-se assim que a banda entrou em palco. Os três novos temas, “Analog Player in a Digital World”, “Chumocracy” e “Liar´s game”, saíram de rajada nos riffs da guitarra de João Guincho e nos acordes de suporte de baixo de João Leitão.
Revisitaram o álbum ‘Old, New, Fast & Slow’ (2022) com o tema “Love Hurtz” e “Someone is Watching You”. Antes de regressarem ao novo álbum, agradeceram a presença do público e convidaram-nos para nos aproximarmos do palco e irmos para o golden circle (risos). Com um inicio a fazer lembrar os slows de festa de garagem dos anos 1980 (ou uma balada de heavy metal), “Won’t do it again” seguido do single que dá nome ao álbum, “Rock and Roll Salvation”, que é como quem diz ‘bora lá salvar o Rock malta!’ Num ritmo ligeiramente mais pop e melódico, “Disconnet”, que nos obrigou a gingar os ombros e abanar a carola. E foi nesta altura que Paulo Franco pediu uma salva de palmas aos Dapunksportif , e disse que a teimosia da banda levou a que “passado 21 anos ainda estão a lançar álbuns“.
Já a meio do concerto e com toalhas de rosto a limpar o suor (o rock cansa!), mais três malhas, “Friends” (‘Electro Tube Riot, 2008), “Daily Grind” (novo álbum) e “Raw & Vulnerable” (‘Old, New, Fast & Slow, 2022). Esta última com destaque para as teclas (Vicente Santos) que acompanharam os riffs das guitarras com uma energia hipnótica (faltou o saxofone do Cabrita!).
“I can´t move” (‘Ready!Set!Go!’, álbum de estreia de 2006) tema bastante melódico, projetando-nos para texturas mais próximas de um rock psicadélico, com as teclas a levarem o rumo da melodia. “Cavalinho!” Mais uma paragem para agradecimentos à Anti-Corpos e à ADF. “Se têm o álbum partilhem, façam o que quiserem, nós já fizemos a nossa parte!”
Na reta final mais dois temas que se prolongaram, principalmente o “Summer Boys” também do álbum de estreia, onde deram largas à criatividade e brincaram com os instrumentos, com as teclas a acompanharem a ressonância do pedal das guitarras. Enquanto o mestre da bateria (Fred Ferreira) não deu o sinal, continuaram num despique contínuo a exorcizarem os seus demónios coletivamente. Terminaram com um tema do novo álbum,”Just another Day”, com uma estrutura sonora mais ‘arrumadinha’, quem sabe para acalmar os espíritos demoníacos que por ali se levantaram. E praticamente sem pausas, a noite continuou com mais ritmo ainda, não fosse o Nuno Calado o DJ Set da noite.
No próximo dia 26 de abril, no rescaldo das comemorações da liberdade, a partir das 21h o ‘Rock de Combate‘ invade o palco da ADF. Com Victor Torpedo and The Pop Kids, Maduro Maia na 1ª parte e Luis Varatojo (DJ Set), será certamente uma noite que promete. Nós vamos estar por lá!