Após as finais W:O:A Metal Battle Portugal decorridas na quarta-feira, 24 de Abril, que coroaram justamente os Vøidwomb e que solidificaram o speed/thrash n´ roll dos Cobrafuma, o primeiro dia do XXIV SWR Barroselas Metal Fest casou com o 50.º aniversário do 25 de Abril de 1974. Alguns festivaleiros cantaram “Grândola Vila Morena” na passagem de 24 para 25 de Abril, mas, no próprio dia 25, só o metal, o punk, e o hardcore foram ouvidos, sempre sem lápis azuis, sempre com respeito pelo gosto ou desgosto do próximo. Os veteranos portugueses Redemptus, e os veteranos brasileiros Disgrace And Terror, estes na ronda de promoção do recente disco “The True Will Of Evil”, foram os responsáveis pelos primeiros acordes de liberdade, os portugueses ao som do seu sludge lento e pesadão e os portugueses do outro lado do mar a prestarem culto ao metal mais rápido e agressivo dos anos 1980. Ambas as bandas deram concertos bastante sólidos.
VERME
ALPHA WARHEAD
COBRAFUMA
REDEMPTUS
DISGRACE AND TERROR
Os Lisboetas Toxikull foram a primeira banda a pisar o palco principal (Abyss stage), também eles a promoverem “Under The Southern Light”, lançado em Fevereiro de 2024. Praticantes de um heavy/speed metal que em nada foge aos anos de ouro do género, os Toxikull são, talvez, a banda nacional que melhor se encarregou de o perpetuar. Set robusto e uma qualidade de som invejável, algo que ouviríamos ao longo dos três dias no palco principal independentemente do estilo. Já no palco exterior (Arena stage), os portuenses Sonneillon preparavam-se para mais uma descarga de black metal radical. Ainda vamos em Abril e a banda já editou 3 registos em formato nobre, mas trata-se de algo relativamente comum no género. Prestação com algumas deficiências sonoras, algo que também se viria a verificar mais tarde no palco exterior.
TOXIKULL
SONNEILLON
A primeira surpresa do dia viria na forma dos Lik, que também se dedicam a louvar o que de melhor se fazia em Estocolmo, Suécia no início dos anos 1990: death metal extremamente agressivo propulsionado pelo pedal BHM-2 e pelo eterno som de motosserra que baptizou todo um género. Para os mais rodados, a visão da arte icónica do eterno Mark Riddick espalhada por todo o palco já anunciava o que aí vinha. Ainda que o último disco da banda tenha sido lançado há quase 4 anos, e pese o facto de ter o selo de qualidade Metal Blade Records, trata-se de uma banda relativamente desconhecida do público nacional. Após esta prestação sem mácula, a primeira em terras lusas, será por pouco tempo.
LIK
Sucederam-lhes os irlandeses Vircolac, a banda que maior curiosidade nos causou no primeiro dia. Praticantes de um death metal mais oldschool e cavernoso, o som de saída dos Dublinenses foi contaminado por uma moléstia qualquer que só nos deixou ainda mais curiosos. Ouvimos, aqui e ali, pinceladas de um brilhantismo inegável, mas que teimou em escudar-se da luz do dia graças ao som miserável que, presumimos nós, tenha sido optado pela banda com outra intenção. Sugerimos uma audição mais demorada e atenta a “Veneration”, o longa-duração editado há pouco mais de 2 meses e que gostaríamos de ter entendido melhor ao vivo. Ainda assim, excelente surpresa oriunda de um país que não é particularmente conhecido por ser um porta-estandarte do heavy metal, mas cuja marca de água é a originalidade e a diferença.
Os norte-americanos Bell Witch foram um dos momentos mais esperados do primeiro dia, mas também dos mais polémicos. Praticantes de funeral doom metal, os norte-americanos tocaram um único tema, “The Clandestine Gate”, com a duração de quase 84 minutos. A prestação da banda dividiu o público: uns queriam ir dormir, ao passo que outros estavam hipnotizados; uns outros reclamavam que não tinham pago o bilhete geral para ver uma banda tocar (sic) “uma música e meia” e outros ainda que tinha sido um concerto para recordar. A opinião da Música em DX vai de encontro a ambas as facções. Se é verdade que o desempenho de Jesse Shreibman e Dylan Desmond foi preciso e sem mácula, também não é mentira que sentimos a falta de um norte, de uma cola que fizesse a estrutura manter-se em pé. Gostamos de funeral doom metal, caso de Ahab ou Esoteric, mas nem os mestres alemães e ingleses se aventuram em temas de 84 minutos. Ao contrário do que muitos pensam, trata-se de um género que não é, de todo, de fácil execução (vão lá tentar tocar com aquela velocidade e precisão e depois digam como correu). Porém, é anestesiante – se ouvido em casa com a máxima atenção, acreditamos que seja uma experiência única. Ao vivo, principalmente para quem nunca ouviu falar da banda ou, sequer, do género, pode transmitir uma sensação de estranheza e frustração. Ainda assim, é o género de entretenimento ímpar que encontramos todos os anos no SWR e só podemos agradecer à organização pela coragem e fidelidade com que sempre construíram os seus line-ups.
BELL WITCH
Para combater a letargia instaurada pela banda anterior, os suecos Fredag den 13:e brindaram-nos com o seu crust/dbeat altamente contagiante e que faz abanar a cabeça invariavelmente. Prestação sempre a 180 km/h, sempre catchy, sempre a suar litros e litros de suor. Tiveram a infelicidade de antecederem os reis do death metal do dia 1, os ingleses Cancer, que acabaram por dar o melhor concerto do primeiro dia. Poucas bandas europeias conseguem ombrear com os Cancer quando o assunto é death metal clássico, pré-Estocolmo, pré-Gotemburgo, pré qualquer coisa antes da massificação do death metal como a conhecemos. Com o disco de estreia “To The Gory End”, os naturais de Telford granjearam um culto imediato com riffs cortantes, letras simples mas concisas, e a sensação de que, música após música, algo de muito errado estava para acontecer.
Trocámos algumas palavras com Daniel Maganto (baixo), amigo da redação, que nos indicou que o vocalista/guitarrista John Walker sente sempre nervosismo antes do início de cada concerto, mesmo ao fim de tantos anos. Sentimos esse nervosismo logo no clássico inicial “Blood Bath”, mas não durou mais de 3 segundos – daí em diante, a banda debitou uma chuva de clássicos (“Into The Acid”, “Death Shall Rise”, “Hang, Drawn And Quartered”) e intercalou-os com temas do genial “Shadow Gripped”, de 2018 (tais como “Garrotte” e “Ballcutter”). Som impecável, violência a rodos, o regresso do stage-diving e do slam e, em última análise, uma das melhores prestações dos 3 dias foi aquilo que os Cancer nos deixaram em cerca de 50 minutos. Concerto invejável.
CANCER
Os neo-zelandeses Diocletian não poderiam estar mais alheados sobre os concertos de outras bandas, mas é inegável que estiveram muito concentrados no deles. Quem conhece a banda e o género, um black metal superagressivo e a roçar-se insistentemente no war metal, sabe o que aí vem e sabe que os Diocletian regam a fogueira com gasolina. A prestação, muito esperada por ser a estreia da banda em Portugal, rendeu todos os esforços envolvidos pela brutalidade, precisão e pelo óbvio descompromisso com padrões, modas e ondas. Com o novo álbum apontado para Julho, foi uma excelente oportunidade para se apresentarem e ao seu trabalho à comunidade portuguesa. Apresentação perfeita, som excelente mesmo no meio de tanto caos e a sensação e que tocaram muito pouco.
Seguiram-se-lhes os norte-americanos Terrorizer, banda seminal de grindcore dos anos 1980, e as expectativas são sempre altas, principalmente quando é no SWR Barroselas que David Vincent, formador do projecto, toca com os Terrorizer ao vivo pela primeira vez na sua carreira. Ao comando das vozes, Brian Werner, que se apresentou em 2019 a frontear os Vital Remains e a abrir para os I Am Morbid. E, claro, na bateria mais um dos membros fundadores da banda, o lendário Pete “Commando” Sandoval. Do princípio ao fim, aquilo a que assistimos foi a um concerto digno de nota, mais ou menos de calendário para Vincent, com uma boa comunicação com o público por parte de Werner, e com a sensação de que um metrónomo se poderia orientar pelo trabalho de Sandoval, tal é a precisão suíça que o lendário baterista inscreve a cada momento. Werner teve alguns do melhores momentos da noite, incluindo quando disse ao público que a banda tinha lançado um dos álbuns mais importantes da história do género, (sic) “World Domination”, quando perguntou, em alusão à suposta falta de movimento do público mais atrás se aquilo era um concerto dos Trivium (quando o guitarrista da banda é Richie Brown, ex-Trivium)ou quando tentou criar uma wall of death e o público lhe deu a volta e começou a wall of death antes do seu sinal de partida, mas foram momentos de menor importância tendo em conta a magnitude do concerto, que contou com uma qualidade sonora impressionante.
Os temas apresentados foram quase exclusivamente extraídos de (agora sim) “World Downfall”, um clássico maior com 16 temas, todos eles também clássicos dentro do género, sem excepção. Juntamente com “Horrified” e “Scum”, “World Downfall” é considerado amiúde como parte fundamental da Santa Trindade do grindcore por motivos óbvios. Ficaram na memória malhas como “After World Obliteration”, “Corporation Pull-in”, “Enslaved By Propaganda”, “Injustice”, “Dead Shall Rise” e “Human Prey”. Se tivessem repetido o concerto logo de seguida, não teriam aborrecido ninguém.
TERRORIZER
Para finalizar a noite, e na ausência dos Schizophrenia, os Vøidwomb substituíram-nos para apresentarem, uma vez mais, os motivos que levaram a Avantgarde Music a assinar contrato com a banda. Som perfeitamente audível, blackened death metal de alto calibre e uma vontade e dedicação de ferro fazem com que a banda, também ela originária de Barroselas, se torne, aos poucos, numa das novas coqueluches mundiais do género. Com o disco “Spiritual Apotheosis” lançado dois dias depois do concerto que os catapultou para o Wacken Open Air, onde certamente tão bem nos representarão, o futuro deste jovem quinteto é bastante promissor.
Vøidwomb
