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Não sabemos o que o amanhã nos traz, mas aguardamos de sorriso nos lábios! – Uma noite com The Smile

Tenho a certeza que nunca vamos esquecer os dois anos surreais que entraram de rompante nas nossas vidas e nos tiraram parte dela. Tal como o pré 25 de Abril e o Ultramar, estes marcos negativos que a humanidade vai vivendo ficam, pelo menos na nossa história.
No entanto, não só de nós no peito nos encheu a pandemia! Felizmente, dotou os génios e/ou artistas de ferramentas para criar, compor e nos oferecer algum conforto. 

Foi o que aconteceu com Thom Yorke e Jonny Greenwood (Radiohead) e Tom Skinner (Sons of Kemet) que criaram The Smile no ano de 2020 e nos trouxeram em Maio passado A Light for Attacking Attention, qualquer parecença ao polo positivo da pandemia, não é mera coincidência.
Na passada sexta-feira,
8 de Julho, o Coliseu dos Recreios recebeu uma enchente de calor físico, metafísico e sonoro que gerou um sorriso uniforme de uma ponta à outra do espaço. 

Para primeira parte, o americano sediado no Reino Unido Robert Stillman. Se o trio seguinte é composto de génios, este compositor multinstrumentista não lhes fica atrás. Sintetizadores, teclas, loop station, samplers em cassete e saxofone foram os seus melhores amigos para em três músicas e meia hora de concerto nos trazer momentos de leveza, harmonia, tranquilidade, de orquestra e de profunda intensidade. O concerto foi marcado pela falta de respeito das pessoas que iam entrando na sala e as que estavam já lá dentro, que fizeram mostrar que estavam lá para ver The Smile e não queriam saber de mais nada, não deixando quem estava, sentir o concerto na sua plenitude. 

Uma intro falada anuncia a entrada dos The Smile em palco e Thom Yorke assume lugar ao piano naquele seu modo apaixonante e emocionante de se entregar ao piano como se fosse uma extensão dele. A melancolia de Radiohead muito presente nesta primeira “Pana – Vision” serviu de aperitivo para a fusão de rock com electrónica que viria durante grande parte do concerto. Entre sintetizadores, guitarra, baixo, piano, harpa, baterias e sabe-se lá mais o que os olhos e ouvidos não alcançaram mas que o coração absorveu, foram tocadas as 13 músicas que compõem este A Light For Attacking Attention, transpondo o renascimento de cada um de nós para estas faixas e momento. Pelo meio do rock a distorção e a electrónica fundem-se numa espécie de perturbação sensorial avassaladora que nos proporciona uma catarse física e mental desnorteante.  

“Colours Fly”, música nova estreada há cerca de um mês, surge a meio e tem a participação de Robert Stillman no saxofone que abrilhanta, ainda mais, esta nova canção que antecedeu a hipnotizante, bela e intensa “We Don’t Know What Tomorrow Brings”! Mais perto do fim chega mais uma música nova, “Bodies Laughing”, que traz uma harmonia conjunta e em uníssono abraçando-nos lentamente. Para terminar, em conjunto com Robert, “You Will Never Work In Television Again” e o seu ritmo desenfreado de rock cru a escorrer artie e post rock. 

Já de barriga cheia, ainda fomos brindados com mais quatro músicas, duas que estavam em falta do disco, outra nova “A Friend Of a Friend (People on Balconies)” e a “Feeling Pulled Apart By Horses” de Thom Yorke, num momento mais electrónico em que Thom nos pediu para nos levantarmos todos e com eles dançarmos nesta recta final.

Uma lufada de ar quente com sentimento de ar fresco nesta nova Era moderna da melancolia que, apesar de ter a voz e a guitarra de Radiohead (entre outros instrumentos) é uma ramificação bastante distante dos mesmos. Não melhor, não pior, mas de igual modo bela e majestosa!