Opinião Reviews

O punk safado, ainda que romântico, dos Doutor Assério

Por vezes aguardamos por uma luz, algo que nos possa guiar, indicar ou, até, iluminar de alguma maneira. Essa luz pode guiar-nos a sítios escuros e escondidos que precisam de ser descobertos por algum motivo. Aí, onde o sol não chega, nem brilha, encontramos, por vezes uma tranquilidade esvoaçante que vamos ansiando nesta montanha russa que é a vida.
Onde o Sol Não Brilha não é apenas esse lugar é, também, a festa suja e harmoniosa dos Doutor Assério.

Os Doutor Assério são de Barcelos e não vão curar ninguém com medicina. A única cura que oferecem é a da música com as suas façanhas e artimanhas. Folia, festa e punk safado é tudo o que se pode ter neste segundo trabalho do trio composto por Tó Meira (bateria), Leonel Miranda (baixo) e Pedro Silva (guitarra e voz). Depois do Homónimo lançado em 2017, os Doutor Assério surgem de modo mais assertivo e persuasivo. O punk que trazem pouco tem que se lhe diga, mas quando é feito com algum carisma, sobe na distinção e eleva-se entre o punk rock comum que se vai ouvindo por aí. Definem-se como possuidores de um punk romântico por abarcar o lado de folia e o de letras de amor, ainda que sarcásticas. Acredito que não poderá haver uma melhor definição para eles. 

Onde o Sol Não Brilha foi apresentado no passado dia 14 de Fevereiro e é composto por 7 músicas curtas e grossas! A produção tem mais feição e a composição é mais redonda, ainda que suja. A introdução de sopros contribuiu, em muito, para uma excelente aparência revigorada e, amplamente, desejável.
“Gonorreia”, primeiro single, apresenta-se com um ritmo alegre e jocoso. Os sopros aparecem, aqui, e combinam maravilhosamente bem com o tom irónico e audaz que vai, depois, acompanhar o resto das músicas. O cartão de visita é, assim, um convite a uma loucura apetecível e com vislumbres de passarmos todos um bom bocado juntos. 

Em “Amor Ditador” descobrimos a porta de embarque para uma viagem ao final dos anos 80 e início dos 90 onde o boom do punk-rock surgiu em Portugal e a música era simples, directa, dançável e “sem merdas”. As letras eram sempre cobertas com mantos preversos e de libertinagem, devido à libertação de uma opressão então existente. “C’A Mão Baby” é sem dúvida um Hit de verão para ouvir na piscina ou no rio com os amigos. Numa viagem adolescente das de antigamente! O ritmo é sempre provocante e traz consigo um excelente jogo de guitarra e baixo que formam uma melodia irrequieta e insana. A bateria contribui muito para a velocidade da viagem e à característica deste punk-rock sujo e não tão banal como se tornou nos dias de hoje.
Não só de festa vive este álbum, havendo, igualmente, espaço para a balada do baile onde vamos dançar, como se de um slow se tratasse, de caras encostadas e dente no lábio numa tentativa de sussurrar palavras ironicamente doces ao ouvido do nosso par. Para rematar, uma música que poderá servir de campanha a um partido de esquerda ou até um candidato independente! Uma farra divertida a saber a mini e a amendoins numa praia com o sol alaranjado das 20h e uma inocência pouco pura, mas extremamente feliz e descontraída, de uma roda de amigos sedentos de descoberta. Assim acaba esta viagem rápida, crua e quente ao melhor daquilo que nos alimenta a alma. Ao longo do disco, ouvimos uma guitarra assanhada e um baixo ritmado e ardente que nos vai criando vontade de ir para o lado deles e saltar. 

Onde o Sol Não Brilha, não é uma novidade, para além de se rodear de um carisma puro, consegue deslocar-nos temporalmente e colocar-nos em tempos que foram áureos neste género musical o que, na minha modesta opinião, tem um sabor divino! 

Podem saltar e dançar de sorriso aberto, metendo play aqui.  

Foto capa – Gonçalo Costa