No dia seguinte ao concerto dos Band Of Holy Joy, alguém comentou no café do meu bairro, que numa rádio nacional tinha sido feito referência a uma banda lendária inglesa, que havia tocado em Lisboa na noite anterior.
A minha descrença começou à partida por imaginar qual era, mas incrédulo perguntei se seria Band Of Holy Joy que o meu interlocutor teria ouvido: “Isso mesmo”. Há coisas na vida engraçadas. Na noite anterior esses seres lendários actuaram para menos de metade da capacidade do Sabotage.
Na sexta-feira, 3 de Novembro em Lisboa, estava eu ansioso por entrar no clube mais rock do Cais do Sodré e assistir a Band Of Holy Joy. Era uma estreia para mim, e embora a sala não estivesse cheia como referi, algo que seria desejável para uma banda desse estatuto, não esmoreci.
A primeira parte seria preenchida pelos portuenses Quiet Affair que faziam a sua estreia em Lisboa ao fim de três anos de existência da banda, conforme o vocalista João Pedro Gama referiu em palco. Esta é uma banda com músicos com alguma experiência. João Pedro Gama é o antigo mentor das Amarguinhas e o guitarrista Pony assim como o baterista Tércio fazem parte da actual formação dos Trabalhadores do Comércio.
A música dos Quiet Affair navega por um folk rock onde a voz do vocalista sentado em palco, munido de uma guitarra acústica é apoiada por uma banda em formato rock com alguns coros também por parte do baterista. Ao longo da prestação desta banda do Porto vamos ouvindo melodias vocais bem executadas, a voz do vocalista é um dos pontos fortes como referi pelo menos neste género musical onde o rock melodioso se mistura com o elemento mais acústico e despido da voz e guitarra.
Terão tocado cerca de dez temas com toda a calma do mundo. As músicas eram tranquilas, exemplo disso o tema “Fly” onde os refrões melodiosos se vão desenrolando com alguns alguns riffs igualmente melodiosos de guitarra e uma secção rítmica bem esforçada e trabalhadora, aliás, uma constante no concerto. E talvez seja o melhor exemplo de como funciona a música dos Quiet Affair. Cumpriram bem a função de banda suporte, embora nitidamente tocam um género rock diametralmente oposto ao post punk cabaré vigoroso que estaria por vir a seguir o que também não lhes facilitou as coisas. Ainda assim uma prestação segura por parte deste quarteto do Porto.
O concerto dos Band Of Holy Joy começou com uma garra enorme, Johny Brown por si só com a sua atitude e comunicação com a assistência, enche o palco e os músicos que o acompanham enchem o espectro sonoro. Atrás, vemos Inga Tillere com um laptop a controlar as projeções ao fundo do palco que resultaram muito bem neste espaço. O som esteve muito bom ao longo da prestação e logo a partir do segundo tema a mistura de som estava perfeita.
Canções do novo trabalho Funambulist We Love You foram privilegiadas no alinhamento – as belíssimas “A Lonesome Dove” e “ A Revivalist Impulse” por exemplo, têm toda a magia que se espera deste colectivo e são construídas à base de melodias muito simples que James Stephen Finn vai debitando na guitarra que contrastam com a postura crooner de Johny e a sua voz muito característica. A secção rítmica com Mark Beazley no baixo e Steve Hands na bateria foi sempre segura ao longo do concerto. “Come Home to Me” do EP deste ano Brutalism Begins at Home também marcou presença. A excelente “The Land Of Holy Joy” do álbum com o mesmo nome, de 2015, com melodia de inspiração oriental desenhada pelo teclista Peter Smith foi outro dos momentos altos.
Mas ficaram esquecidos muitos outros temas mais antigos que se poderiam ter feito ouvir nesta apresentação em Lisboa – a banda optou por uma apresentação mais sóbria privilegiando material dos seus discos mais recentes saltando a parte do “antes” e privilegiando a parte do “agora” no alinhamento deste concerto. Quem soube esperar ainda ouviu “Fishwives”. Esperamos nós também que esta não seja a ultima vez que tenhamos este reencontro com uma das bandas mais invulgares que os anos 80 nos trouxeram, e que está num pico assinalável de criatividade.
Foi realmente uma pena que não houvesse mais público para puxar por este colectivo que se limitou a debitar genialidade numa hora e pouco de concerto com um profissionalismo ímpar. Formulo o desejo que da próxima vez que voltem, o público corresponda em número mais condigno para abrilhantar a prestação destes senhores. Até lá, até uma próxima Johny Brown e Co!
Texto – Pedro Corte Real
Fotografia – João Rebelo