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Um voto nos Postcards

Em dia de eleições legislativas, nada melhor que “fechar as urnas” ao som da banda libanesa indie-folk, Postcards, num sítio tão aconchegante como a Pensão Amor no Cais Sodré em Lisboa.

Quando chegámos ainda estavam a fazer o soundcheck, pois a correria pelo país foi grande, tiveram 9 concertos de Norte a Sul em pouco mais de 10 dias. Dos museus às carruagens de comboio, o trio de Beirute encantou o nosso país, com os dois EP’s “Lakehouse” (2013) e “What lies so still” (2015). Na verdade os Postcards são um quarteto, mas o baixista Rany Bechara não conseguiu o visto Shengen e não pôde acompanhar a banda, tendo sido substituído pelo André Galvão (Voodoo Marmelade e Let´s Folk). Vicissitudes dos (desa)acordos internacionais em que até à 3ª geração se tem um “passaporte de refugiado palestiniano”, mesmo sendo libanês… Não temos dúvidas que Rany será um músico tão inteiro como Julia Sabra (voz, Ukele, guitarra e bandolim), Marwan Thome (guitarra e voz) ou Pascal Semerdjian (bateria, harmónica e voz).

As salas estavam bem compostas, com muitos estrangeiros (turistas e estudantes) e lisboetas quanto baste para o dia que era. Longe da agitação das mesas de voto e das projecções mediáticas, “Origami” (primeiro tema do ultimo EP) foi o tema escolhido para abrir a actuação dos jovens de Beirute. “Hoje é um grande dia para Portugal, é dia de eleições!” Dizia Julia depois de se apresentar e trocar a guitarra clássica pelo ukele, em movimentos tranquilos como a sua voz em temas como “Summertime”, e “River”, música que dedicou aos refugiados sírios (segundo as palavras de Julia, “a imagem da criança morta na praia”). O tema “Where the wild ones” entrou de seguida, (uma das músicas com mais ritmo de cordas) e as pessoas que estavam na sala ao lado foram se aproximando, acompanhando o ritmo da música com os ombros e com um sorriso.

Entre as músicas, onde variavam os instrumentos como a harmónica, as maracas, o bandolim e os samples (violino) e nos remetiam para uma espécie de levitação num folk-rock descomprometido, Julia partilhava com humor algumas intimidades da banda. Afinal os Postcards não deixam de ser “o clássico”, ou seja os 4 amigos que se tornaram numa banda de música. E foi essa cumplicidade que transmitiram durante toda a sua actuação, mais notória entre Julia e Marwan (ao seu lado direito), pois a disposição do palco também não a permitia ver Pascal (bateria a trás de si). “Oh the places we will go”, tema que fala sobre a liberdade, e da dificuldade que têm no Líbano para obterem vistos para circularem livremente na Europa. Prova disso foi a ausência do 4º elemento da banda (baixista).

Os Postcards tocaram mais um par de músicas, mas a vontade de ficarem mais que as 10 horas seguintes, foi verbalizada (regresso a Beirute). Depois dos agradecimentos sentidos aos técnicos portugueses (som, logística, promotores, etc.), ainda tiveram tempo para beber uma cerveja connosco (MDX).

Os Postcards são um grupo de amigos que tocavam covers nos bares de Beirute, e começou a levar a música mais a sério quando gravaram o primeiro EP “Lakehouse” (2013). Todos estudantes universitários, que se vêem a viver da música e para a música num futuro próximo, não estivesse a Julia Sabra já na sua segunda graduação superior de Música, na Universidade Americana de Beirute. Marwan e Pascal estão a terminar engenharias, mas não é por isso que não levam a música menos a sério. O terem tocado com a banda norte-americana “Beirute” no Libano, foi também um momento sério e que os deixou muito orgulhosos. Quando lhes perguntei porque não gravaram um CD, foram consensuais na resposta, “preferirmos gravar dois EP’s, em vez de um CD por ser mais pequeno e por isso se tornar mais fácil, não nos comprometendo e assim também serviu como um teste”. Mas infelizmente se quiserem comprar os seus discos, só por encomenda, não tendo conseguido a distribuição na Europa. Nós tivemos sorte e até os conseguimos autografados! Postcards no regresso a Beirute, e que seja até à próxima!

Texto – Carla Sancho
Fotografia – Luis Sousa