Backstage

Gator, The Alligator e a bolha mágica da realidade

Depois de uma linha em ascensão onde rapidamente conquistaram inúmeros fãs de norte a sul do país, o fenómeno Gator, The Alligator regressa ao estúdio para nos trazer o segundo disco da banda.
Mythical Super Bubble é a consolidação da banda e uma viagem de Gator na descoberta da aprendizagem que é a vida. Trata-se de um disco com 8 faixas que resultam de algo conceptualmente estruturado construindo uma linha de continuidade com “Life Is Boring”. O psicadelismo mantém-se vivo e as explosões, agora feitas em modo adulto, continuam a abanar-nos.  

Foi a propósito do lançamento deste segundo disco que estivemos à conversa com Eduardo (guitarra) e Filipe (bateria) acerca de toda a sua imagética e construção, falando também do percurso deste Jacaré endiabrado. 

MDX – Falem-me do processo de criação/construção do disco. 

Eduardo – Para este disco queríamos dar um step up em relação ao primeiro. O primeiro foi uma coisa mais espontânea do nosso começo, como banda. Para este queríamos uma coisa conceptualmente mais coesa, um trabalho com mais sustento, tanto a nível de músicas como de imagem, como de conceito. Queríamos fazer uma coisa mais adulta, também, a puxar mais pela nossa musicalidade e pelo nosso skill. Tentámos experimentar certas coisas que foram dar a este novo álbum. Como projecto, é uma coisa mais sólida.
Filipe – Foi algo que surgiu naturalmente também porque correu paralelamente com a nossa evolução como banda e músicos e foi fruto de toda a experiência. Acho que a evolução do álbum também foi a nossa evolução como pessoas e com a interacção musical do grupo. 

MDX – Disseste que quiseram trabalhar mais a parte conceptual. No press release percebe-se que há uma história à volta de Gator, é desse conceito que falas? 

Eduardo – A nível conceptual é mesmo a história que o Gator passa do início do álbum até ao fim. Ele vai à procura de uma utopia que é a bolha; música a música essa história vai-se desenrolando para depois chegar ao fim e é como se fosse um clímax. Ele está lá e a bolha rebenta e a vida perfeita não existe. Conta a jornada dele até à bolha, que é uma metáfora, música a música e depois todas se unem porque fazem todas o álbum que é a sua busca pela utopia. Começa com o pacto com “Demon” que é do outro álbum e vai continuando. 

MDX – É uma continuidade mas adaptada a uma nova história? 

Eduardo – Sim, uma coisa mais dark, mais de jornada e de aventura. 

MDX – Falemos um pouco do vosso crescimento. Olhando para outras bandas, foi um crescimento rápido e brutal, do nada já estavam a tocar pelo país inteiro e em festivais. O que foi para vocês esse crescimento, como o encaram e se estavam preparados para ele?

Eduardo – Acho que a melhor sensação que temos é ver a confiança que quem nos convida tem no nosso trabalho porque mesmo não tendo muitos concertos, na altura, confiaram em nós para ir a certos palcos que já eram maiores e com mais responsabilidade e foi bom ver essa confiança e que nós pudéssemos responder também bem a esses desafios. Se calhar foi tudo um pouco mais rápido talvez por causa dessa confiança que nos puseram.
Filipe – Se nós não tivéssemos essa oportunidade de mostrar o nosso trabalho também não conseguíamos ascender desta maneira. Claro que, para nós, sentimos que foi uma subida gradual mas os degraus eram grandes e sentimos que íamos subindo patamar a patamar e isso também nos foi trazendo uma confiança maior em nós. De certa forma só tivemos consciência da evolução que estávamos a ter tempos depois de certos concertos acontecerem. A ficha só caiu depois porque ia acontecendo um melhor e depois outro e outro e só fomos indo na avalanche sempre a fazer o nosso melhor e tentando chegar cada vez a mais público e mais promotores, e foi acontecendo. 

MDX – Acham que o Termómetro ajudou a isso? Tendo em conta que é composto por um júri onde estão os mais importantes promotores do país, rádios e outros músicos. 

Eduardo – Sim, mais que não fosse por ficar com o nome na cabeça ou mesmo com o prémio da ida ao Bons Sons. Foi importante porque há gente que um ano depois ainda diz que nos viu lá e que gostou muito e acho essa ida aos Bons Sons foi o maior boom que tivemos de exposição também por causa da cobertura que o festival tem. Ver como o público aderiu a um concerto de rock psicadélico à tarde, no meio de uma aldeia foi muito bom.
Filipe – O termómetro veio trazer uma cena boa que foi dar uma certa credibilidade à banda no sentido de às vezes ser preciso uma entidade superior validar a banda para ela ficar com um certo estatuto. O termómetro veio trazer um bocado isso e abriu-nos muitas portas.
Eduardo – Outra coisa bom foi ter nacionalizado um pouco a banda saíndo da nossa terra e começando a ter um percurso maior. 

MDX – E terem aberto para bandas internacionais, também, como The Valley e The Mystery Lights. 

Eduardo – Sim sim! É sempre um grande objectivo abrirmos para alguém de fora, no caso dos Mystery Lights é uma banda que nos influencia e é bom isso ter acontecido.
Filipe – E partilhar backstage, experiências, é sempre muito bom e gratificante. 

MDX – Por falar em bandas que admiram… A primeira vez que vos ouvi/vi disse que vocês eram os KIng Gizzard portugueses por todas as parecenças quer em palco quer em sonoridade e até no nome. Queria saber se esta semelhança que vocês têm é propositada/assumida ou se é um inconsciente muito ligado às vossas influências. 

Eduardo – Apesar de ser uma referência para todos acho que fazemos isso um bocado genuinamente. Acho que mesmo que eles não o fizessem, nós fazíamos, apesar de serem uma influência. Acho que é desta maneira que queremos passar o nosso som, que por acaso, é semelhante à deles.
Filipe – É desta maneira que funcionamos. Isto é o resultado da nossa junção e coincidiu com a deles.
Eduardo – Acho que a nossa maneira de dar um espectáculo vai um pouco de encontro à deles mas não é uma coisa forçada, pomos o nosso toque também. Também tentamos ter um som que não se ouça só cá em Portugal, que seja aceite no mundo. Queremos que o projecto se expanda internacionalmente e por isso temos essa noção de ter um som que se adapte a vários públicos. 

MDX – Já que falam nisso, os King Gizzard são muito grandes, já correram o mundo e têm fãs por todo o lado. Acham que se não existem os King Gizzard, que juntaram imensas pessoas e mostraram que há muitos fãs desse estilo de música, que vocês chegariam tanto às pessoas como chegam? 

Eduardo – Acho que aqui em Portugal há uma comunidade muito maior de fãs desse estilo de música específico mas não sei. Acho que ajudou sim, mas nós íamos fazer uma coisa assim na mesma.
Filipe – Nós íamos fazer, mas será que a aceitação era a mesma? Se calhar não. Como cá não existe nada assim, acho que é a questão da validação. Parece que as pessoas têm que sentir que alguém aprova para depois gostarem e alguém fazer um projecto e ser aceite. Se calhar podia ser aceite mas visto de uma forma mais geral nessa lógica, às vezes tem de haver uma validação maior. Acho que o nosso som foi o resultado da mistura de nós os 4, a aceitação é que é diferente e acaba por ter interferência sim. 

MDX – Falem-me do processo de lançar o disco em plena pandemia e as perspectivas de apresentação ao vivo. 

Filipe – O nosso disco era para ser lançado em Abril. Nós gravámos antes de ir de tour e durante a tour estivemos a tratar dele e a preparar tudo para quando viéssemos da tour pudéssemos preparar o lançamento. Chegámos da tour e o mundo parou, então tivémos de nos ir adaptando às circunstâncias e ir sempre adiando, fasear o lançamento com o lançamento dos singles. Lançámos agora porque temos de o lançar, não dá para adiar mais, fomos até ao limite. Poderíamos adiar até ser possível fazer uma tour de lançamento mas achamos que o álbum tem um tempo e o tempo é este.
Eduardo – Decidimos tentar adaptar o lançamento à situação em que estamos do que adiar, porque chega a uma altura em que já não faz sentido porque podemos querer ir preparando outras coisas em estúdio e não faz sentido lançar uns a seguir aos outros. Agora é jogar com o que temos. 

MDX – Mas têm datas? 

Eduardo – Vamos tendo uma data ou outra apesar de não ser nada muito certo, temos algumas confirmações. Claro que não vai ser uma coisa intensa de estrada e vai ser mais virado para os locais que podem realizar eventos agora como teatros e algo do género. 

MDX – Onde é que acham que este caminho que estão a fazer vos pode levar ou onde é que gostariam que vos levasse?

Filipe – O mais longe possível. Nós queremos sempre chegar o mais longe possível, ao maior público possível. Temos consciência que é por partes, mas damos sempre o nosso melhor para conseguir.
Eduardo – Queremos tentar o máximo para também ter o máximo. Esta fase abalou imenso mas como já estávamos definidos, não deitou tudo a perder. Se isto fosse o lançamento do primeiro álbum, estaríamos mais desmotivados. Mas como estamos mais coesos já ajuda a que não se perca tudo. Isto é uma fase e vai demorar o tempo que tiver de demorar a passar mas acho que é algo que tanto promotores como bandas vão carregar na bagagem, quem sobreviver. Se calhar há coisas que vão começar a ser vistas de outra maneira, as coisas vão mudar.
Filipe – Acho que isto vai trazer mais valias, por mais que não seja a valorização da parte cultural do nosso país que é uma deficiência muito grande. Veio abrir um pouco os olhos para isto. Acho que é o lado positivo disto. Só temos de aguentar e quando isto melhorar atacar outra vez. 

MDX – E para terminar, a vida é uma seca? 

Filipe – É quase um contrassenso, nós gostamos de brincar com as coisas e meter as oposições juntas. Esta abordagem que nós fazemos de que a vida é uma seca é quase para chamar a atenção para a realidade e para a monotonia que é o dia a dia e que podemos tornar a rotina em “não seca”.
Eduardo – Por isso é que esta abordagem começou mais electrizante, mais a expor a cena de seca. Que não é uma seca mas nós às vezes é que a fazemos assim e depois queixamo-nos que a vida é que é uma seca.
Filipe – Sim, é o contrassenso. Brincamos com isso. Mas não é uma seca! Nós é que a fazemos uma seca às vezes. 

Como desejo final ficam alguns pedidos: “Ouçam o álbum e dêem feedback que nós gostamos de ouvir o feedback de todos. É isso que nos motiva. Comprem discos e merch! Que é a maneira de ajudar agora. Quando tivermos uma data pronta que as pessoas apareçam!”

Podem ouvir e adquirir o disco aqui