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Steven Wilson, sonho de uma noite de inverno

Na passada quarta-feira debaixo de um frio cortante aventurámo-nos até à Sala Tejo da Altice Arena para assistir ao concerto de Steven Wilson. Este foi o primeiro concerto da tour To The Bone, nome do último registo de originais editado em 2017.

A sala compôs-se rapidamente entre as 20h e as 21h com uma miríade de gente de todas as idades formando-se um aglomerado bastante heterogéneo e descontraído. Em relação à qualidade do que iria suceder não existiam grandes dúvidas, existiam algumas quanto ao que iria de facto surgir em palco. Não será certamente fácil escolher um set entre tudo o que Wilson já fez. Algumas das pessoas com quem falei mencionavam a expectativa de o ouvir tocar músicas dos Porcupine Tree, a banda que mais se notabilizou entre os seus variados projectos. Outros houve que me falaram de músicas especificas. Em suma, existia uma expectativa calma e serena sobre o que a noite traria, mas sentia-se uma emoção à flor da pele, uma sensibilidade mais acutilante do que o habitual em concertos desta dimensão.

Como tem vindo a ser apanágio das salas grandes o espectáculo iniciou no horário indicado; 21h. Uma rede cobria a frente do palco, e uma voz informa que antes do concerto começar iríamos assistir a algumas imagens que nos iriam contextualizar todo o evento. Uma sucessão de imagens do mundo, de pessoas, situações quotidianas, de politícos, de violência, de amor e de guerra atravessam a nossa retina acompanhadas de adjectivos e substantivos. a ordem inverte-se e as imagens subvertem as palavras.

To The Bone dá o mote e Wilson e a sua banda são recebidos efusivamente. As projecções na tela em frente ao palco aumentam toda a dinâmica da banda e a sua interacção com o público, sendo possivél ver muita gente emocionada com o momento que vivia, quando num passe de magia a cortina é arredada e, agora sim conseguimos ver realmente toda a banda que arranca com Nowhere Now, também do último albúm, com a maioria da sala a corresponder em toda a linha. Só após a terceira música, Pariah, onde divide a música com a cantora Ninet Tayeb, que se mostrou ao público através da projecção de palco do video da música, é que Steven Wilson se dirigiu ao público, agradecendo e explicando que sendo que esta se trata da primeira data da tour seríamos um pouco as suas cobaias, pois apesar de terem praticado arduamente o alinhamento, hoje será talvez o dia em que alguma coisa poderá correr menos bem. Steven Wilson é um front man com um à vontade sui generis. Fala com o público como se se dirigisse a cada um de nós individualmente tornando a interecção perturbadora e desconcertante mas ao mesmo tempo apaziguadora.

Home Invasion e Regret#9 do album Hand Cannot Erase levam-nos a entrar na viagem àquela componente muito mais dentro do progr rock das composições mais elaboradas e intrincadas de Wilson, proporcionando em conjunto com as imagens projectadas uma verdadeira catarse. No entanto são os primeiros acordes de The Creator Has a Masterpiece, música dos Porcupine Tree que emocionam a sala. Wilson já havia dito que iria revisitar temas dos Porcupine Tree, alguns deles não sendo tocados ao vivo há bastante tempo, outros sê-lo-iam pela primeira vez. Refuge e People Who Eat Darkness do último registo tiveram aqui a sua estreia na tour, duas músicas completamente diferente entre si mas que se completam amplamente no momento que a banda havia criado com o público e que antecedeu um intervalo de 15 minutos anunciado por Wilson e em que muitos aproveitaram para descomprimir fora da sala.

Muito embora um pouco surpreendidos pela pausa, há que reconhecer que esta terá sido uma das melhores ideias atendendo ao tempo de concerto que Wilson nos havia prometido ao explicar em traços largos no início o roteiro que nos haviam programado.Tudo corria como orquestrado, o público fluía entre os vários espaços e quando Wilson regressa com os acordes de Arriving Somewhere But Not Here dos Porcupine, imediatamente os poucos que ainda se encontravam fora do recinto acorreram à maravilha de a ouvir passado tanto tempo. Mas eis que Steven Wilson nos interpela com a seguinte pergunta: How many of you like pop music? E ali sobre essa questão desenvolve um raciocionio nada vão. A maioria dos ali presentes torcem concerteza o nariz ao Pop segundo o raciocinio de Wilson… Mas e os Beatles? O raciocinío de Wilson tem tanto de credivél como de discutivél, e certo…tudo isto para nos apresentar uma outra música do novo disco porque toda ela tem um travo a pop fresca que em pouco se relaciona com a maioria do trabalho de Wilson, Permaneting. E se houve algum público que compreendeu Wilson, creio que foi mesmo apenas algum. Os momentos seguintes viriam a ser preenchidos com uma sucessão de músicas dos Porcupine Tree como Lazarus ou Heartattack in a Layby, intercaladas com músicas mais antigas de Wilson como a bastante aplaudida The same Asylum as Before ou as mais recentes Song Of I ou Detonation.

O set deveria terminar com outra dos Porcupine, Sleep Together, mas a banda já nos tinha informado que essa seria aquela parte em que faria de conta que o concerto terminava para voltar logo de seguida… e assim foi, nuns escassos dois minutos voltaram ao palco para nos brindar com um momento deveras intimo e singelo com Even Less e Harmony Korine. Quase três horas de concerto para resumir quase trinta anos de música. A escolhida para finalizar, The Raven That refuses to Sing com a projecao poderosa do video, deixou alguns com a emoção à flor do olhar, mas como ficar indiferente à torrente de emoções que Steven Wilson empurra para cima do público num fantástico equilibrio entre o elemento visual e a sonoridade densa deste?

Rendidos e emocionados ao concerto cuidadosamente preparado por um Steven Wilson muito bem acompanhado por Adam Holzman no sintetizador, Craig Blundell na bateria, Alex Hutchings na guitarra e Nick Beggs no baixo, abandonámos a Sala Tejo em direcção à noite gelada e brilhante junto ao rio num misto de felicidade e melancolia.

 

Texto – Isabel Maria
Fotografia – Marta Louro