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Roteiros de um festival, os concertos a não perder no NOS Primavera Sound

É oficial: estamos a dois dias do arranque de mais uma edição do NOS Primavera Sound. Para este ano de 2017, o festival que decorre nos dias 8, 9 e 10 de Junho contará com um cartaz de luxo, tal como tem sido usual ano após ano. Apesar de contar com grandes nomes do panorama musical da atualidade a encabeçar o cartaz – Bon Iver, Justice e Aphex Twin serão os artistas de maior relevo ao longo dos três dias do evento – o festival do Porto sempre se destacou pela vasta oferta que apresenta no seu cartaz, havendo sempre diversos géneros musicais representado nos quatro palcos distintos que tomam residência no segundo fim-de-semana de Junho no Parque da Cidade.

Ter um vasto leque de artistas a constituir o seu cartaz juntamente com o facto de ser um festival constituído por quatro palcos, funciona como uma espécie de faca de dois gumes para o NOS Primavera Sound: sobreposição de banda foi sempre o ‘problema’ que paira na cabeça dos festivaleiros que preparam os últimos arranjos para se perderem nos deslumbres que residem na cidade invicta. Tendo como base esta situação tumultuosa, a Música em DX deixa aqui uma pequena lista dos concertos que consideramos essenciais e a não perder ao longo do festival. Face à magnitude dos cabeças de cartaz, onde se toma por garantido que farão parte do roteiro de muitos, nenhum irá integrar esta lista, sendo o prepósito desta dar a conhecer as outras ‘pérolas’ que o NOS Primavera Sound tem para o seu fiel público.

Cigarettes After Sex – Dia 8, Palco NOS (17h55)

Os Cigarettes After Sex são um caso raro de como as redes sociais podem impulsionar a carreira de uma banda: através do fenómeno do ‘passa-a-palavra’, a banda liderada por Greg Gonzalez atingiu rapidamente a meta dos vinte milhões de visualizações – hoje, contam-se cinquenta – na plataforma YouTube com o seu tema “Nothing’s Gonna Hurt You Baby” sem qualquer procedente discográfico, seja disco ou EP. Aliás, os norte-americanos preparam-se para (finalmente) lançar o seu longa-duração, tendo já uma vasta legião de fãs que se apaixonaram pelos seus temas, quase todos singles, assim como pelo seu único EP, EP I, onde a canção que os mostrou ao mundo foi finalmente lançada em formato físico.

Para aqueles que se questionam do porquê de todo este alarido, basta escutar o (ainda) curto reportório dos Cigarettes After Sex: a banda consegue desencadear toda uma pureza de espírito através de uma melancolia límpida e bela, falando sobre juras de amor reais e credíveis, fugindo do clássico romantismo irreal que tanto apoquenta as canções de amor nos dias de hoje. Estes relatos de paixão nua e crua proporcionam instantes em que qualquer apaixonado se consegue relacionar com, despertando momentos belos em que uma canção e o ser humano são um só. Aproveitando a regalia de estrearem o palco principal do NOS Primavera Sound, o Parque da Cidade será o cenário ideal para mil e uma trocas de afeto entre casais fluírem e de sorrisos reminiscentes de momentos românticos das nossas vidas fluírem.

 

Flying Lotus – Dia 8, Palco Super Bock (23h30)

Há determinados artistas que são capazes de soltar sensações equivalentes àquelas que umas quantas doses de estupefacientes conseguem desencadear no ser humano através de sonoridades muito “tripy”. Experimentando com estilos tão diversos como música eletrónica, hip-hop, jazz ou psicadélica, está Steven Ellison, mais conhecido pelo seu pseudónimo Flying Lotus. A forma como o DJ – rapper nas horas vagas – consegue conciliar todo um universo de diferentes registos musicais para presentear-nos com ritmos e batidas absolutamente alucinantes, fazem de Flying Lotus uma das grandes referências no cartaz deste ano do NOS Primavera Sound para todos aqueles que queiram usufruir dos efeitos secundários que a música consegue despertar.

Todavia, Steven Ellison é muito mais do que um produtor de melodias alucinogénias: a mente brilhante do americano leva-o a inovar de disco para disco, não tendo medo de arriscar e conseguindo sempre transpor as suas ideias mirabolantes com sucesso, ou não fossem todos os seus cinco discos de originais aclamados pela crítica, que aplaudem o crescimento ascendente da sua música. Sem nunca dar um passo em falso, Flying Lotus arrisca-se a ser um dos produtores mais cobiçados de um futuro não muito distante, visto que estamos perante alguém que conta com um vasto leque de artistas de renome que já colaboraram consigo, dos quais Kendrick Lamar e Thundercat se destacam. Tendo a benesse de não ter nenhuma sobreposição de bandas durante o horário da sua atuação, estamos perante um dos concertos que se advinham como sendo um dos mais dará que falar no rescaldo do NOS Primavera Sound.

 

Swans – Dia 9, Palco . (22h)

Esta será a última tournée dos Swans como vocês conhecem”. É com este mote que os Swans, influente banda de rock experimental liderada desde os primórdios por Michael Gira, se fizeram à estrada em prol do seu último disco de originais, The Glowing Man. Desde 1983 que o projeto encabeçado por Michael Gira já lançou 14 discos de originais e parece que a hora de dizer adeus está mesmo aí, mas não sem antes passarem por Portugal para uma ‘despedida’ sentida. Apesar de todo o alarido que paira sobre esta tournée de Swans, a verdade é que a banda terá a infelicidade de subir a palco praticamente à mesma hora do que o nome mais sonante do cartaz, Bon Iver, adivinhando-se muitas dores de cabeça para os festivaleiros que faziam intenções de assistir a ambos os concertos.

Mesmo que esta tournée não seja a última dos Swans, ver um concerto da banda de Nova Iorque é sempre uma experiência imperdível: contando com três décadas de estrada na bagagem, estamos perante uma das melhores bandas ao vivo da atualidade. Com uma formação em constante mudança, apenas Michael Gira e Norman Westberg se mantêm desde os primórdios, sendo a sua genialidade a chave da banda e que os permite apresentar uma sonoridade ‘sombria’, focando-se em temas de cariz forte como sexo, religião, morte ou o poder. Fundindo nuances de post-punk, noise-rock ou psicadélico, os Swans tornaram-se numa referência do rock experimental e do panorama musical alternativo da atualidade; para todos aqueles que desejam experienciar um concerto apocalíptico e capaz de arrepiar do início ao fim, não há banda que o faça melhor que Swans.

 

Hamilton Leithauser – Palco Pitchfork (00h)

Autor de um dos melhores discos do ano passado, Hamilton Leithauser está de volta a Portugal, desta vez desprendido dos seus The Walkmen, para apresentar I Had a Dream That You Were Mine. Desde que a banda americana entrou em pausa que Hamilton se tem lançado de cabeça na sua carreira a solo, somando três discos de originais desde 2014. O seu último contou com a participação a tempo inteiro de Rostam Batmanglij (ex-Vampire Weekend) e a junção entre as suas ideias inovadoras encaixaram na perfeição no timbre parcialmente rouco de Hamilton Leithauser, onde a onda da música country e rock n’ roll americana dos anos 60 é rejuvenescida para os tempos de hoje, assinalando um belíssimo disco que dá vontade de ser escutado de uma ponta à outra.

Acompanhado por um tripleto de músicos consistentes, Hamilton Leithauser tem todos os materiais para recriar a beleza de I Had a Dream That You Were Mine em palco, ora não fosse a voz do vocalista dos The Walkmen praticamente idêntica fora de estúdio, mesmo com toda a energia que insere em todas as suas atuações ao vivo. Ao seu mais recente disco, juntam-se ainda os anteriores Black Hours e Dear God – Paul Maroon dos The Walkmen também colaborou – no repertório a ser apresentado, havendo ainda a certeza que algum dos temas mais emblemáticos da banda de “The Rat” também estarão incluídos. Em suma, estamos perante um concerto que irá a seguir a fórmula do ‘2 + 1’, o que não há para gostar?

 

King Gizzard & The Lizard Wizard – Dia 9, Palco . (01h00)

No espaço dos últimos anos, não há banda que tenha conquistado mais os portugueses que estes australianos de nome, no mínimo, peculiar. Estrearam-se em Portugal em 2014, no Vodafone Mexefest e desde aí já passaram pelo Super Bock Super Rock e o Vodafone Paredes de Coura, sendo já uma presença assídua todos os anos. Desengane-se quem pense que estas passagens recorrentes pelo nosso país estão a tornar-se fatigantes, visto que os King Gizzard & The Lizard Wizard são das bandas mais trabalhadoras que por aí andam, lançando, praticamente, um disco por ano desde que surgiram. Com uma formação de sete tipos amantes de música e sedentos por adrenalina, o rock psicadélico da banda australiana é um festim frenético de sonoridades, onde se destacam as baterias siamesas ou até uma flauta transversal, tudo com o intuito de impulsionar as suas vibes psicadélicas.

Quem já viu um concerto de King Gizzard & The Lizard Wizard sabe bem a euforia desmedida que acontece. Os australianos são uma autêntica máquina, bem oleada, a dar concertos, contagiando tudo e todos com a sua energia alucinante. Em todas as ocasiões que passaram por Portugal, ‘mosh’ e ‘crowdsurf’ eram as palavras de ordem, tal não é o seu rock psicadélico com vestígios de acid rock contagiante. Com a promessa de lançarem cinco (!) discos de originais neste ano de 2017, onde dois já viram a luz do dia, material novo não faltará para todos aqueles que pretendem em repetir a dose ou estrearem-se pela adrenalina de um concerto de King Gizzard & The Lizard Wizard, ficando desde já o aviso que este será provavelmente um dos concertos mais incendiários do NOS Primavera Sound.

 

Sampha – Dia 10, Palco Super Bock (21h)

Foi ao lado de SBTRKT que Sampha começou a dar os primeiros passos no panorama musical, onde temas como “Hold On” e “Temporary View” se tornaram em alguns dos mais populares hits de Aaron Jerome. Para além de dar voz aos temas, o britânico era uma presença constante nos concertos de SBTRKT, tendo inclusive produzido alguns dos seus discos. A veia de ‘produtor’ existente em Sampha continuou ao longo dos anos quando este coproduziu discos de artistas tão diversos como Drake, Solange ou FKA Twigs. Bom entendedor de música, foi no ano de 2017 que Sampha finalmente lançou o seu primeiro longa duração, Process, com a espera a mostrar-se recompensadora: para além de toda a técnica sonora que levou tempo a ser masterizada, a mensagem devastadora da perda da sua mãe e a procura em arranjar forma de superar a tragédia mostra uma faceta pessoal e única.

Elogiado de forma tremenda pela crítica, Sampha conseguiu provar que todo o trabalho que antecedeu Process não só enriqueceu os seus conhecimentos musicais como também o ensinou a gerir e a saber soltar todo o potencial inserido dentro do britânico. Estando a ser apelidado como o novo menino de ouro do R&B, Sampha prepara-se para fazer a sua estreia a solo em palcos portugueses no dia 10 de junho no NOS Primavera Sound, motivo mais do que suficiente para tê-lo em conta no nosso radar. Com o potencial de Sampha finalmente a ganhar forma, temas como “Blood On Me” ou “Timmy’s Prayer” serão alguns dos argumentos que estão prestes a deixar meio mundo perdido de amores à sombra da pala do Palco Super Bock.

 

Death Grips – Dia 10, Palco . (22h)

Gíria comum diz que “o melhor fica sempre reservado para o fim” e, no caso do NOS Primavera Sound, os explosivos Death Grips ficaram mesmo reservados para o fim. Dizer que aquilo que caracteriza o tripleto californiano é apenas o seu hip-hop experimental é ser bastante vago, ou não fossem eles conhecidos por serem autênticos monstros em palco. A fórmula dos Death Grips é simples mas (muito) eficaz: Zach Hill é um endiabrado baterista, Andy Morin encarrega-se de toda a componente eletrónica proveniente de um computador e MC Ride dá a voz às palavras, gritos e gemidos de Death Grips. O resultado é uma caótica experiência musical capaz de se ouvir em Marte, causando euforias sem precedentes em quem as ouve.

Um concerto de Death Grips é uma experiência imaginável por alguém que ainda não a tenha vivido: no meio de todos os crowdsurf, mosh ou walls of death, há um desejo de tentar replicar todo o turbilhão de impulsos que a música dos californianos desperta em nós. Por momentos, a música deixa de ser canalizada pelos nossos ouvidos e passa a ser exprimida através de movimentos. Não há um único momento parado durante as atuações de Death Grips, tal não é a genica e resistência que estes tipos foram construindo ao longo dos anos, ficando desde já garantia que a adrenalina tumultuosa será uma constante. Se, ao fim dos três dias de festival, sobre alguma réstia de energia, tem que ser gasta obrigatoriamente aqui.

Japandroids – Dia 10, Palco Super Bock (23h20)

O último concerto a encabeçar esta lista trata-se de um regresso muito aguardado: Japandroids. Depois de uma pausa de aproximadamente quatro anos, onde informações sobre o desfecho da banda nunca foram reveladas, a dupla oriunda do Canadá voltou com mais energia do que nunca, lançando disco novo e embarcando numa extensa tournée que tomará residência no NOS Primavera Sound. Near to the Wild Heart of Life, o primeiro disco de originais da banda no espaço de cinco anos, veio demonstrar que Brian King e David Prowse não perderam o toque de criarem temas cheios de garra e fulgor, assim como o rock se exige.

Desde a sua formação que um dos elogios que mais eram apontados à dupla era a forma como o seu rock alternativo conseguia conciliar dois mundos num só: o do rock clássico dos anos 70 com o punk rock dos 80. A junção entre estas duas facetas primordiais do rock nos dias de hoje foi sempre a chave do sucesso dos Japandroids, embora tenha sempre existido o cunho pessoal dos dois canadienses. Depois da sua última passagem por Portugal acuar ao ano de 2013, numa altura em que o NOS Alive ainda dava pelo nome de Optimus, eis a oportunidade perfeita para matar saudades e relembrar os ritmos frenéticos dos Japandroids, numa atuação que se prevê nunca abrandar; tal como nos vieram a habituar.

 

Poderiámos ficar horas a fios a explicar o porquê de muitos dos artistas que este ano integram o cartaz do NOS Primavera Sound serem concertos a não perder, mas a verdade é que, no geral, quase todos apelam à curiosidade dos festivaleiros e, de certeza, haverá sempre um ou outro concerto inesperado que conseguirá encher as medidas a quem o assistir; este sempre foi o mote do festival, ao apostar em bons artistas que por vezes não têm que ser os mais mediáticos do planeta.

No meio de tanto bom artista no seu cartaz, o difícil agora será conseguir fazer um roteiro fazível onde seja possível conseguir ver um pouco de tudo do que se tinha previsto inicialmente, mas temos quase a certeza que, pelo menos, alguns dos nomes que a Música em DX aqui propôs irão constar na lista de muitos. Preparem-se pois o NOS Primavera Sound arranca já esta semana.

O Música em DX marcou presença nas edições de 2015 e 2016 do NOS Primavera Sound. Para recordar os grandes momentos das duas edições anteriores basta clicar em NOS Primavera Sound 2015 e NOS Primavera Sound 2016. Para seguir a edição deste ano, está tudo em NOS Primavera Sound 2017.

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Texto – Nuno Fernandes
Fotografia – Hugo Lima | NOS Primavera Sound 2016