Concertos Reportagens

Flamingods + Kilimanjaro, Mil trovões para deixar Lisboa em cacos

Verde – verde milho, verde Minho. Sem pantone, sem classificações universais. Uma casa e outra sem qualquer métrica pré-estabelecida e estradas que se tornam ruas. O Minho, ou parte dele, é o caos. O ruído vindo de um sino, da procissão ou da venda na feira tudo será jamais classificável. O imprevisto é tradição – os The Comet is Comming num concerto de máximo impacto a encerrar o Palco Taina na edição passada do Milhões de Festa ou, na Casa Azul, o furacão Black Bombaim + Rodrigo Amado + Isaiah Mitchell (Earthless) e Shela.

O imprevisto é tradição e a descoberta obrigação. Desconhecidos para a grande maioria dos presentes os Flamingods foram das bandas que mais se destacaram na edição do Milhões de 2014. Sonoridade inebriante, interpolações rítmicas pouco evidentes e sobretudo uma capacidade para criar um volume sonoro nada despiciendo. O público por mais cansado que estivesse jamais os esqueceu e eles também não, chegando a afirmar que foi o melhor concerto que alguma vez tinham dado. Com este cartão-de-visita a banda londrina apresentou-se no passado dia 08 de Julho no Musicbox. A expectativa, como não, era elevada e a esperança de repetir noite em rotação máxima era mais do que sustentável. Independentemente de uma casa ocupada a menos de metade (efeito do fenómeno eucalipto que os grandes festivais são capazes de causar?), a combustão rítmica baseada nas precursões foi intensa. O bando de privilegiados foi resistindo e acompanhado na medida que as forças permitiam as constantes mutações de Kamal Rasool, Charles Prest, Sam Rowe, Craig Doporto e Karthik Poduval. As mudanças nos instrumentos sucediam-se, adicionavam-se efeitos eletrónicos, e o cowbell, de quando em vez, a acompanhar as projeções. Estas ora remetiam para universos mais naturalistas, ora para contextos mais étnicos. Imagens de mongóis (?) na galhofa, uma tulipa em tons incandescentes e construções caleidoscópicas. Simultaneamente, as músicas expandem-se. Ganham uma nova forma, absorvem alguns momentos de pausa, quase imperceptíveis é certo, e com isso novo folego, mantendo, no entanto a velocidade bem alta.

Andinas, berberes e caminhantes dos desfiladeiros, os amantes do Easy Rider, os relaxados do Lótus Azul, um imaginado trio eléctrico numa mais que desejada rebelião dos excluídos da Praça Sintagma, os do Forte Prenistino, os que acamparam na Praça Sol e a eles ainda mais 10 000 russos, mais o Sugoku e os restantes guerreiros do espaço todos convocados. E se não bastar, a estes se junte, toda a potência da guitarra e voz, bateria e baixo que descarregam os Kilimanjaro numa primeira parte sem conceções. Os tempos não estão para melodias de embalar, exige-se destruição para a reconstrução. Nada pode ficar na mesma. Se isto foi o começo, auguram-se amanhãs esplendorosos.

Texto – João Castro
Fotografia – Miguel Mestre