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The Sunflowers, o que faz uma dupla do Porto em Lisboa?

Corria o ano de 2015 quando os The Sunflowers, dupla oriunda do Porto, lançaram o seu segundo EP de originais, Ghosts Witches and Pb&Js, e desde cedo que começaram a provocar um notório burburinho pelos meios de comunicação portugueses. Preenchendo uma lacuna no panorama musical português relativo ao punk psicadélico nu e cru, Carolina Brandão e Carlos de Jesus revelaram-se autênticas máquinas de cozinha ao confecionar temas vibrantes e enérgicos, um prato que cai sempre bem independentemente do apetite que assombra o estômago.

Não querendo perder o hype que pairava pela banda, o ano passado ficou marcado pelo lançamento do seu primeiro longa duração, o muito aguardado The Intergalactic Guide to Finde the Red Cowboy, que veio apenas cimentar que temas como “Mama Kim” não foram obra do acaso. Numa fria tarde de janeiro, os The Sunflowers vieram fazer uma visita à cidade capital para promover o seu mais recente disco e a Música em DX teve a oportunidade de falar com a banda para saber um pouco mais da sua história e sobre aquilo que o destino lhes reserva.

The Sunflowers, o que faz uma dupla do Porto em Lisboa?

Música em DX (MDX) – Como é que os The Sunflowers surgiram?

Carlos: Eu tinha uma banda folk com um amigo e nós estávamos à procura de um baixista e de um baterista. A Carolina veio preencher o lugar do baixo, mas como não arranjámos baterista e ela estava a começar a tocar bateria, acabou por ficar com esse cargo. Entretanto, o meu colega saiu do projeto e acabámos por ficar só os dois.

Carolina: Tendo continuado apenas nós, aprendemos a tocar os instrumentos melhor do que aquilo que já fazíamos e acabámos por criar uma boa dinâmica de trabalho.

MDX – O vosso primeiro EP foi gravado completamente em casa, mas foi através do segundo – Ghosts, Witches and Pb&Js – que ganharam reconhecimento a nível nacional, nomeadamente com o tema “Mama Kim”, que rodava em algumas rádios nacionais. Pode-se dizer que esse foi o momento em que se aperceberam que poderia haver um público recetivo e desejoso pela vossa música?

Carolina: Sim, foi, pois com esse EP tivemos muitos mais concertos e as coisas foram de vento em popa.

Carlos: O pessoal passou a gostar mais, o que se revelou, para nós, um bom sinal e que nos incentivou a levar as coisas mais a sério.

MDX – O ano passado lançaram o vosso primeiro disco, de nome The Intergalactic Guide to Find the Red Cowboy. Sentem que este pode servir como rampa de lançamento para a vossa conquista no panorama musical português?

Carolina: Acho que esse é um dos principais objetivos que depositámos no disco, que servisse como um cartão-de-visita para os The Sunflowers. Graças a ele, conseguimos criar uma base mais estável enquanto banda e agora é ver para onde nos leva.

Carlos: O disco já chegou a França, tendo um editor francês a trabalhar connosco para lançar o álbum por lá, o que nos deixa contentes por saber que, não só em Portugal mas como também pelo mundo fora, há muita gente a comprá-lo.

Carolina: Temos estado a vender muito, através do Bandcamp, lá para fora: Alemanha, Estados Unidos, …

MDX – Espanha? Visto que atuaram por lá…

Carolina: Curiosamente, em Espanha, acho que ainda não se vendeu nada…

Carlos: Uns dois ou três, acho, mas também já nos disseram que Espanha não é um bom território para música, para concertos. Todavia, quando fomos lá tocar, achámos o pessoal gente muito porreira.

Carolina: Nós estávamos tão contentes quando fomos a Madrid, por ter sido uma experiência nova, que nem quisemos muito saber do concerto; estávamos noutro país a tocar para um novo público e isso foi uma sensação ótima.

MDX – Falando em novos públicos, deduzo que França já tem alguns fãs ansiosos pela vossa estreia por aquelas terras.

Carolina: Não sabemos, mas vamos descobrir em breve (risos)

MDX – Vocês têm percorrido Portugal de lés-a-lés, sempre com boas afluências a nível de concertos. Sentem que já formaram fortes elos de ligação para com os vossos fãs?

Carolina: Acho que já temos alguns, sim. No outro dia fomos tocar ao Maus Hábitos, onde abrimos para The Parkinsons e andava por lá um rapaz que, quando se chegou junto de nós, mostrou-nos uma t-shirt que ele próprio tinha desenhado e onde estava o nome da nossa banda juntamente com a imagem de um alien. Ficámos tão contentes com aquela dedicação que acabámos por lhe oferecer um vinil; mesmo com os The Parkinsons, o rapaz dizia que só tinha ido para nos ver.

Carlos: Acho que o facto de estarmos um pouco no gozo faz com que sejamos mais acessíveis para com os fãs: somos descontraídos, tentamos ser sempre simpáticos, somos nós que ficamos responsáveis pelo merchandising da banda…

MDX – Comparando o vosso segundo EP e o LP, é palpável a evolução da vossa sonoridade. Atribuem-na ao vosso trabalho e posterior crescimento enquanto músicos?

Carlos: Sim, muito culpa daquilo que ouvimos: quer seja antigo ou recente, acabamos sempre por descobrir coisas novas e que, no fim, acaba por influenciar o nosso trabalho.

Carolina: De certa forma, todos os concertos que demos acaba por impulsionar o nosso crescimento enquanto músicos; tocamos muito melhor agora do que o fazíamos há ano e meio e isso ajuda-nos a criar músicas melhores.

MDX – Os The Sunflowers são constituídos por apenas vocês os dois, mas em alguns dos vossos concertos têm a presença de um baixista a acompanhar-vos, não é verdade?

Carolina: Quando se trata de um festival de verão ou concertos ‘maiores’, recrutamos sempre um baixista. Uma das nossas músicas mais fortes e que o público adora-a, “Zombie”, tem todo um outro cenário quando se tem um baixo a acompanha e, por vezes, acabamos por convidá-lo a tocar connosco. Contudo, ele não é um elemento da banda e, ultimamente, não temos recorrido tanto à sua ajuda de forma a não transparecer a ideia de que somos um tripleto.

Carlos: Por vezes, aparece mais por conveniência quando ele e a sua banda (800 Gondomar) vêm para a estrada connosco, como aconteceu no Reverence ou no Rock in Rio Lisboa, onde, no dia do nosso concerto, eles iriam estar a tocar pelo Damas.

MDX – Quais foram as principais diferenças que surgiram face ao processo de gravação do disco em comparação com o vosso segundo EP?

Carlos: Em primeiro lugar, acho que para o álbum nota-se que estávamos muito mais à vontade a trabalhar em estúdio, tendo uma boa relação para com o produtor.

Carolina: Também pesa o facto de ele ser meu irmão (risos).

Carlos: Em segundo, conseguimos comprar material melhor e isso possibilitou-nos a ter o som que almejávamos, algo que não se sucedeu nos EPs.

Carolina: Na minha opinião, o “tempo” também contribuiu na medida em que o processo de gravação dos EPs foi muito lento porque ainda tínhamos um pouco de medo, o que não se verificou no disco, onde as coisas correram a um ritmo muito mais rápido e culminou num disco que representa aquilo que queríamos fazer.

MDX – Nesse caso, poderiam dizer que se tornaram em músicos mais capazes e habilidosos?

Carolina: Gostamos de pensar que sim, mas as vertentes mais técnicas não são muito connosco – escalas e afins. Quase todos os meus irmãos são músicos e percebem bem como funciona a teoria musical, mas foi algo para o qual eu nunca tive muita paciência para aprender sobre. Na minha opinião, um dos problemas do pessoal que frequenta os conservatórios de música é que acabam por ficar demasiado ligados à parte teórica e depois não conseguem fugir desses conhecimentos; pessoalmente, para aprender a tocar bateria, juntei as peças, comecei a tocar livremente e com o passar do tempo cheguei lá, ou seja, é a tocar que se aprende, é a compor que se aprende. Claro que no meio de todos os concertos que já demos, com o que aprendemos em estúdio, íamos com muito mais técnica e capacidade de improvisação.

MDX – No meio de todo o vosso registo musical – que reúne tanto punk psicadélico com fuzz – a componente vocal dos vossos temas sobressai bastante, talvez por contar com a presença de ambos. Como é que repartem essa tarefa, a de decifrar quem deve cantar em que temas?

Carolina: O Carlos é a voz principal da banda, cabendo-lhe cantar grande parte das músicas, enquanto eu prefiro dar uns retoques que considere necessários por gostar muito da vertente das harmonias e tentar acrescentar novas sonoridade. Aliás, ao fim ao cabo, a voz acaba por ser um instrumento como qualquer outro e temos que trabalhá-la tal como fazemos com os restantes, conseguindo sempre contrabalançar o meu tom mais agudo e o grave do Carlos.

MDX – Por serem só as vossas duas mentes nos The Sunflowers, como é que se desencadeia o processo de criação dos vossos temas e de ideias?

Carolina: Entre nós, há uma química muito forte que leva a que não seja necessário discutir durante muito tempo sobre o caminho a seguir para cada tema, fluindo tudo dentro das normalidades. Isto é quando não nos chateamos durante os ensaios, o que leve a que lhe atire uma baqueta à cabeça, mas tudo sempre a brincar (risos).

MDX – Quais as principais diferenças entre tocar no concerto em nome próprio do que num festival de verão?

Carolina: É completamente diferente, por exemplo, o Barreiro Rocks foi um festival e tocámos num bar, mas acabou por se tornar num dos melhores concertos que já demos; tínhamos o baixista a tocar e a fazer crowdsurf ao mesmo tempo! Era mosh por todo o lado, o bar estava completamente partido… foi uma experiência fantástica. No fundo, acaba por ser uma experiência diferente do que, por exemplo o Rock in Rio, que acaba por ser um festival mais aberto e sem um grande nível de intimidade com o público.

Carlos: Há também aquela questão de quem um público de festival vai ao festival em si, enquanto em concertos a solo vai essencialmente para nos ver. Lembro-me no Braga Music Week quando saltei para o público na tentativa de fazer crowdsurf e bati com a guitarra num miúdo qualquer, deixei-o a sangrar e mal subi ao palco pedi logo desculpa através do microfone, mas acho que ele já se tinha ido embora (risos).

MDX – Com novo disco e em plena tournée, quais as vossas expectativas para o futuro dos The Sunflowers?

Carolina: Para já, temos França que, com a reedição do disco, muito possivelmente vamos andar por lá a divulgá-lo por concertos. Por consequente, é esperar que se consiga algum tipo de internacionalização e tentar chegar a vários mercados, já que estamos a conseguir ter uma boa presença por Portugal. É lutar por um futuro risonho.

MDX – Sempre com pizza à mistura…

Carolina e Carlos: Sempre! (risos)

The Sunflowers, o que faz uma dupla do Porto em Lisboa?

Atualmente em digressão por Portugal inteiro, os The Sunflowers têm concertos agendados para os próximos dias 10, 17 e 18 de fevereiro, em Fafe, Figueira da Foz e Lisboa, respetivamente. Estão aqui algumas oportunidades para se ver uma das grandes bandas portuguesas que se encontram, atualmente, a emergir cada vez mais como uma das novas promessas a acontecer no nosso país. A juntar-se a um excelente concerto, como a dupla sabe sempre dar, há ainda a possibilidade de uns comes-e-bebes com pizza à mistura. Haverá melhor cenário do que um belo concerto servido de uma pizza no ponto?

Entrevista – Nuno Fernandes
Fotografia – Nuno Cruz