Backstage

Galgo, A correria desenfreada pelo simples prazer da música

Galgo e Pensar Faz Emagrecer binómio que se pode afirmar quase como uma marca geracional. Não se assumindo como uma banda de intervenção e sem necessidade de gritar Morte à Bófia, como certamente faziam os seus primos mais velhos, trilham um percurso ascensional meteórico de uma forma natural, aproveitando cada momento para disfrutarem e consolidarem alguns valores que lhes são essenciais – o sentido da amizade, o gosto pela música e o de partilhar estrada, porque afinal o que mais gostam é de passar o tempo juntos.

Queiramos ter pernas e coração para os acompanhar porque estes Galgo ainda agora começaram. Uma conversa ao final da tarde com a banda de Oeiras e a Rute Soares (responsável pelo design gráfico) entre muitas gargalhadas, dúvidas geracionais e a vontade de emagrecer já no dia 29 de Setembro na apresentação do álbum no Musicbox.

Música em DX (MDX) – O último artigo que publicamos sobre os Galgo foi como antevisão do Reverence. O que recordam desse concerto?

Galgo – Foi a primeira vez que tivemos um público mais vasto, foi aquele em que estivemos a tocar para malta de uma onda mais alternativa. Achamos que a nossa música não se enquadrava tanto no Reverence e que destoava um bocadinho da temática do Festival, talvez um pouco mais pesado, mas estava tudo on fire, foi dos melhores concertos na altura.

20160921 - Entrevista - Galgo @ Galegas 7 (Cais do Sodré)

MDX – A partir desse momento, já têm dado bastantes concertos. Quais os que vos ficam na memória, o que pretendem transmitir ao vivo e o que esperam receber do público?

Galgo – A partir desse momento (Setembro de 2015), que foi logo no início e que juntamente com o Alive e com o Sziget foram ao ar livre, pretendemos experimentar palcos mais pequeninos, como por exemplo os Maus Hábitos no Porto ou em Lisboa o Musicbox, foi interessante não só os concertos, como as viagens que fazemos juntos. Viajar só nós, com as nossas coisas, para sítios diferentes.

O do Jameson Urban Routes, o ano passado, foi muito fixe. Não só por termos casa cheia, mas também pela qualidade de som que oferece o Musicbox. Funciona como a nossa casinha, pelo que é normal. No Porto também somos muito bem recebidos, em Guimarães, tanto no Mucho Flow como na Missa do Coelho sentimos um carinho muito especial lá. Também nos recordamos do concerto no Bar Alfa, em Leiria, todos a tocar bem juntos, em círculo, a ver o que cada um estava a fazer. Tocar em círculo não só liberta-nos de algum nervosismo, como permite concentrar mais a nossa energia e explodir um bocadinho mais. Nesse concerto, ao fim da segunda música a Tokutum, já estávamos todos cheios de pica, uma energia tão intensa.

Às vezes a nossa atitude pode ser um bocado introvertida, mas os Galgo pretendem dar sempre o máximo, fazer a festa e concentração total é essa a nossa postura. Concentrados no que estamos a fazer, porque após os ensaios queremos sempre sentir a coisa, dá sempre para nos divertir, estar com a pica.

MDX – Recordando esse concerto do Bar Alfa, não sentem a necessidade de experimentar, nem que seja somente a disposição do palco?

Galgo – Por muito que queiramos estar a experimentar novas configurações, nem sempre é possível, pelos condicionamentos do palco ou outros. Poderíamos tocar de costas para o público como acontecia com os The Jesus and the Mary Chain, mas aí teríamos que crescer mais um bocadinho, mas gostaríamos muito de um dia tocar em círculo no meio do público. Seria muito bom fazer isso na apresentação do disco no dia 29, mas não sabemos se isso será possível. Se calhar faremos ali uma bolinha, para ficarmos mais próximos um dos outros, bem juntinhos (risos).

20160921 - Entrevista - Galgo @ Galegas 7 (Cais do Sodré)

MDX – Sendo uma banda tão recente e com o disco aí na forja como estabelecem a ligação entre os temas e a apresentação ao vivo dos mesmos? Os concertos são, para vocês, um espaço de experimentação?

Galgo – Tentamos diversificar a apresentação de actuação para actuação e de gravação para actuação e tentamos sempre criar algumas divergências no meio das músicas, mas também no que diz respeito às passagens entre elas. As interligações entre as músicas são muito importantes para os Galgo, até porque passamos mais de metade do concerto sem parar. É importante fazer essa ligação, porque cria uma cadência, em que a pessoa não descansa, não há aquele silêncio, não há a necessidade de falar. Se calhar não somos muito comunicativos, tanto pelas letras, que são poucas, como ao vivo, mas comunicamos melhor, melhor talvez não, mas de uma forma diferente musicalmente.

MDX – Já vos aconteceu tocar um tema ao vivo e ele assumir outros contornos, ou seja ir depois para a garagem e trabalham-no de outra maneira?

Galgo – Já. Inconscientemente isso acaba por acontecer, ir para estúdio e vemos que há outra direcção a tomar. É de um forma muito inconsciente, porque se falámos disso foi para aí umas duas vezes. Não há necessariamente essa intenção, pode-se tanto dar o caso de a querermos alterar, como a de a deixarmos simplesmente na mesma.

MDX – Olhando para o vosso percurso parece que assumiram verdadeiramente o nome de Galgo. Neste ainda curto e rápido trajecto quais foram as pessoas essenciais para o vosso percurso?

Galgo – Os Galgos em idade de cão estão para aí na sua adolescência (risos). Como em tudo pensamos que os familiares e amigos são sempre indispensáveis no apoio, aquela malta que vai aos concertos apoiar. Por exemplo o meu pai (do Miguel Figueiredo) quer sempre ver as coisas, ver se está tudo bem, sempre interessado, embora ele não esteja directamente ligado à música. Esse apoio que temos e o feedback que temos deles e dos nossos amigos é muito importante. Para além disso a Mira é muito importante, porque nos permite abrir imensas portas, não só para tocar ao vivo, mas para conhecer outras bandas. Muito provavelmente se não fosse por eles não teríamos chegado onde estamos.

20160921 - Entrevista - Galgo @ Galegas 7 (Cais do Sodré)

MDX – Ainda bem que abordam a questão da Mira. Como agenciamento eles estão também a começar e a tentar fazer uma espécie de família. O quanto é importante haver este sentido de familiaridade e como o trabalham em conjunto?

Galgo – Há não só uma relação profissional, mas também a vontade em fomentar a amizade entre as pessoas. Isso acabou por acontecer naturalmente e foi importante não só para nos relacionarmos muito melhor, mas para ter uma cadência de trabalho muito mais fluída. Foi importante saber que tipo de pessoas eles contactam e para nós saber que tipo de pessoas são, e não alguém distante com quem teríamos uma ligação muito menos próxima. Inicialmente o Fábio acompanhava-nos na estrada, é um bom driver ou quase sempre (risos), e passávamos tempo com ele antes e depois dos concertos. O feedback que eles dão depois dos concertos, não só deles, mas do que vão ouvindo isso também é muito importante.

MDX – A Mira também agencia os Qer Dier entre outras bandas. Como é a relação entre vocês e essas bandas? Há partilha de experiências?

Galgo – Com outras bandas ainda não tivemos assim tantos contactos. O nosso contacto dá-se mais com a Mira porque foram as primeiras pessoas com quem temos trabalhado e também porque fomos a primeira banda da Mira. Como tal sempre tivemos um contacto próximo com eles, mas não tanto com outras bandas. Por acaso não temos nenhuma viagem em conjunto com nenhum deles. Mas não quer dizer que num futuro isso não venha a acontecer.

Com os Qer Dier é diferente até porque já partilhámos palco com eles, uma vez em Coimbra no Aqui Base Tango e outra na Figueira da Foz, e eu (Alexandre Moniz) faço parte da banda, logo é natural que tenhamos esta relação mais próxima.

MDX – Partindo para a gravação do disco – Em que estúdio é que foi e porquê a escolha do mesmo?

Galgo – Gravámos no Haus, que está ligado aos Paus, porque já tínhamos a ambição de trabalhar com eles. Já conhecíamos o trabalho do Makoto Yagyu, que foi um dos produtores juntamente com o Fábio Jevelim, e sempre nos associámos ao estilo musical deles. Por outro lado, a experiência que eles têm também foi muito importante, e gostávamos muito dos sons que eles produziam e que conseguiam captar, por exemplo da bateria. Identificamo-nos muito com essa abordagem ao som, que para nós é o mais importante na verdade. Acabou por ser a melhor opção. Foram não só simpáticos e amigos como bastante profissionais. E também o Miguel Abelaira (Quelle Delle Gazelle) que de vez em quando clickava no space (risos).

20160921 - Entrevista - Galgo @ Galegas 7 (Cais do Sodré)

MDX – Partindo para o que chamo de inquietações geracionais e sendo vocês da época da internet por que é que sentiram a necessidade de fazer o circuito tradicional de tocar ao vivo – gravar álbum – promover álbum através de tour. Há mesmo essa necessidade de ter um álbum? Não bastava pô-lo no Bandcamp por exemplo?

Galgo – É claro que nos poderíamos limitar a tocar, mas pensamos que é importante mostrar às outras pessoas o que tocamos. Alguns dos temas que aparecem neste primeiro trabalho já são temas antigos, daí a necessidade que tínhamos em os mostrar, uma vez que não estavam no EP. Além disso, introduzimos algumas músicas novas, que fomos criando enquanto andávamos em tour e algumas delas bem recentes, e toda essa motivação que ia para lá dos quatro temas que aparecem no EP, isso também fez com que quiséssemos gravar o Pensar Faz Emagrecer.

É também uma forma de podermos chegar ainda a mais pessoas. Começámos a tocar juntos há quatro anos, e é para todos nós verdadeiramente a nossa primeira experiência enquanto banda, tocar ao vivo. Quando gravámos o EP e com os concursos aquilo começou a explodir e de repente estávamos a tocar em várias cidades do país. Na nossa perspectiva foi um pouco fazer o que as outras bandas fazem. Somos um grupo ingénuo (risos), novos e ainda a ver o que se passa. Ao mesmo tempo vimos que havia alguma potencialidade em termos de público e sentimos a necessidade de pôr cá para fora o que andávamos a fazer, tanto em formato digital, como em formato físico.

MDX – Normalmente entende-se o álbum como um todo, onde a parte gráfica também assume um papel muito importante. Quais foram as vossas preocupações nesta matéria?

Rute Soares – A liberdade que os Galgo me deram foi total. No fundo passam-me as músicas, ouço-as, falo com eles e começo a pensar quais são as melhores opções. Esta relação já vem de algum tempo. Comecei a assistir aos ensaios deles, uma das vezes levei o portátil e comecei a desenhar uns quantos Galgos. Durante os ensaios levo alguns esboços, começo a ouvir o som que eles fazem e a partir daí começo a tentar transmitir um feeling. Então, fiquei encarregue de desenhar as cenas deles. Isto desde o início, para aí 2014. É no fundo uma interpretação do som transmitida para as imagens.

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MDX – Há uns anos havia sempre uma grande rejeição em se associar a uma multinacional. As bandas que gostavam de trilhar um caminho alternativo assumiam que gravar/ser distribuídos por uma multinacional era uma forma de ser conivente com o sistema e com todos os mecanismos nefastos, segundo eles, que tal representava. Serem distribuídos por um multinacional nunca foi entrave para vocês?

Galgo – Depende como abordas a questão do DIY ou como deixas que essas interferências te afectem. No nosso caso as músicas que fizemos são nossas, não foi a Sony que as criou, a energia que criamos em palco é nossa não é pré ensaiada. A nossa abordagem é de entre ajuda. Também se deve a uma questão de oportunidade, ou seja a Sony apareceu no momento ideal e foi o que na altura nos pareceu mais apropriado. Por outro lado, se não tivéssemos tido esta oportunidade, muito provavelmente faríamos por nós mesmos, como fizemos com o EP.

MDX – E nunca houve a vontade de interferir no vosso trabalho?

Galgo – Escolhemos um modelo em que não houve qualquer tipo de problema. A proposta foi clara para connosco e para com a agência. Não fomos nós que os abordamos, a Sony é que veio falar connosco e se assim foi é porque certamente gostam do que andamos a fazer.

MDX – Recuando 20 ou 30 anos não havia banda que surgisse que não gritasse Morte à Bófia. Há um desejo subjacente de intervenção na vossa música?

Galgo – Não somos uma banda intervencionista se quisermos colocar nesses moldes. Fazemos música pela componente estética da mesma, pelo som que queremos extrair, pela abordagem.

MDX – Em relação ao concerto de apresentação, dia 29 de Setembro no Musicbox, o que é que podemos esperar?

Galgo – A melhor noite da vida dos portugueses (risos). É festa, uma grande noite, coisas novas para ouvir. Vai ser um set completamente diferente, nunca foi feito, vai ser uma boa oportunidade para ver o que estamos a fazer agora e com a primeira parte dos grandes Quelle Dead Gazelle.

MDX – E porquê Quelle Dead Gazelle?

Galgo – São nossos amigos, são pessoas com quem nos começámos a dar. Em primeiro lugar foi isto, uma relação de grande amizade, e segundo tivemos o privilégio da sonoridade deles ser parecida com a nossa. A partir daí criar um ambiente comum e consistente, algo que faça sentido musicalmente. Foi muito bom para nós terem aceite o convite, uma vez que são uma banda com muito mais rodagem do que nós. O nosso obrigado para eles por isso mesmo.

MDX – Por último, e dada a vossa velocidade vertiginosa, o que é que gostariam de fazer que ainda não tenham feito.

Galgo – Tocar outra vez em círculo. Bem isso já fizemos (risos). Mas a repetir é bastante importante. Tocar fora do país é outro objectivo, já tivemos uma experiência na Hungria não só no Sziget, mas também no A38. Mas foi uma experiência curta. Uma tourzinha, com mais estrada isso já seria muito bom, para fritarmos a cabeça uns aos outros e é uma boa desculpa para passarmos mais tempo juntos.

MDX – Com quem é que gostariam de tocar que ainda não o tenham feito?

Galgo – Com a Rute (responsável pelo grafismo dos Galgo) que agora tem um sintetizador, mas também gostávamos de fazer umas jam’s com o Óscar (Jiboia), o senhor chamuças (risos), ou com alguém com um saxofone.

É difícil, tocámos sempre entre nós, por isso não saberemos como vai ser a relação com a outra pessoa, nesse sentido basta essa pessoa ter uma experiência diferente da nossa que já seria proveitoso. Ou se isto tudo não der certo com o Xutos & Pontapés numa convenção de motards, até porque temos em frente à sala de ensaios uma banda que só faz covers dos Xutos, por isso até nem deve ser difícil ir lá falar com eles (risos).

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Entrevista – João Castro
Fotografia – Luis Sousa